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Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

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Recursos humanos

 

"Eastern Boys" é só o segundo filme de Robin Campillo mas conta com um savoir faire de que muitos autores mais experientes não se podem gabar. E não é por acaso: o realizador marroquino tem tido um percurso tão paciente como o ritmo deste drama, sobretudo ao lado de Laurent Cantet, com quem colaborou no argumento e edição de "A Turma" ou "Vers le Sud".

Dez anos depois de "Les Revenants", estreia a inspirar uma mini-série de culto em territórios do terror, o regresso à realização está mais próximo das obras realistas e sóbrias do cineasta francês. Mas se a influência de Cantet é visível, tanto pelo lado de drama social como pela ambiguidade moral e crueza formal, esta história de um executivo na casa dos quarenta que engata um adolescente imigrante de leste consegue manter uma respiração própria.

A longa sequência do primeiro contacto entre os protagonistas é dos melhores exemplos disso mesmo, com um perfeito sentido de espaço (exterior, numa estação de comboios parisiense) que se mantém nos capítulos seguintes (a maioria ambientada em interiores, na casa do homem mais velho).

 

 

A apontar alguma limitação a "Eastern Boys" será a de as melhores cenas estarem, aliás, logo na primeira metade. Se o arranque promete muito, com uma impressionante gestão de silêncios e olhares, a entrada no apartamento do futuro casal adiciona condimentos de thriller (acentuados mais para o final) numa também longa sequência de luta de classes através da dança. A nova música electrónica francesa ampara um retrato sobre a nova Europa que, como se vê depois, está mais interessado nas pulsões e emoções das personagens do que em utilizá-las como símbolos ideológicos de uma tese.

Até à recta final, Campillo consegue juntar temas habitualmente controversos como homossexualidade, prostituição ou imigração ilegal sem qualquer alarido ou oportunismo, valorizando sobretudo uma relação nascida da carência (amorosa, num caso; financeira, noutro) que se torna mais problemática quando vai deixando de ser fortuita.

Nos últimos minutos, "Eastern Boys" tem talvez a viragem mais surpreendente, mas também a que traz algum desequilíbrio ao tom da narrativa e à plausibilidade do argumento. Não é que mostre menos savoir faire: o realizador tem mão seguríssima para o suspense e acção, o elenco (de actores amadores) está sempre à altura, o retrato social torna-se ainda mais ambivalente e sobretudo angustiante. Só que a solução que Campillo encontra para o casal fica ligeiramente aquém da subtileza de tantas cenas anteriores, deslize que não chega a abalar muito o todo mas deixa uma segunda obra adulta, intrigante e recomendável a um passo de algo ainda melhor.

 

 

 

"Eastern Boys" foi um dos destaques do Queer Lisboa 18 e também faz parte da programação da 15ª Festa do Cinema Francês. Vai ser exibido na Casa das Artes, no Porto, a 16 de Outubro, às 21h30, e no Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães, a 2 de Novembro, às 21h45.

 

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