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gonn1000

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

PROFUNDO AZUL

Se a espaços o filme quase se perde em cenas demasiado contemplativas, compensa-as noutras com uma forte intensidade emocional e visual, de onde sobressaem os expressivos olhares das protagonistas ou a cuidada iluminação com frequentes (e hipnóticos) tons azulados.
A bela banda-sonora instrumental composta por Para One, uma das sensações da nova electrónica francesa, sedimenta a elegância cenográfica e ajuda a que algumas sequências remetam para a carga sensorial da obra de Sofia Coppola, embora Céline Sciamma também mostre o que Catherine Breillat poderia ter atingido em "Para a Minha Irmã!" se não tivesse o propósito de chocar. E assim apresenta uma primeira longa-metragem que surpreende pela maturidade demonstrada e deixa curiosidade quanto a futuros - e breves, espera-se - passos na realização.

Marie, magra e circunspecta, e Anne, obesa e imatura, são duas amigas de quinze anos cuja fisionomia está longe dos estereótipos de beleza seguidos pela maioria dos jovens com quem convivem, e que se coadunam mais com a figura esbelta e delicada de Floriane, não por acaso a adolescente mais disputada do bairro.
Invejada pela maioria das raparigas, esta acaba por gerar alguma cumplicidade com Marie, facultando-lhe o acesso às suas aulas de natação sincronizada em troca de ajuda para que os pais a deixem sair de casa (levando-os a pensar que estão juntas quando na verdade Floriane vai encontrar-se com o namorado).
De um regular ciclo de favores nasce uma relação de amizade que as marca de formas distintas: a Marie porque lhe permite conviver com alguém que admirava em segredo, a Floriane porque lhe garante uma confidente feminina que não almeja tomar o seu lugar.
Os contactos destas duas conhecidas tornadas amigas, assim como as reacções de Anne, são o cerne de "Naissance des Pieuvres", segura estreia na realização da francesa Céline Sciamma, que aqui deixa um atestado de maturidade neste relato do universo da adolescência feminina, partindo de personagens e situações reconhecíveis sem no entanto cair em domínios óbvios.
A realizadora oferece um envolvente estudo de personagens, seguindo os episódios quotidianos de três jovens para quem a infância ainda é um espaço recém abandonado e de difícil articulação com as obrigatoriedades que a adolescência lhes impõe, em particular a forma de se relacionarem com o despontar da sexualidade.



E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

Filme apresentado na 8ª Festa do Cinema Francês, a decorrer até dia 15 no Cinema São Jorge, em Lisboa



Para One - "Finale"

 

Debruçando-se sobre os fantasmas que nascem do modo como as personagens lidam com as mudanças do corpo, tanto em privado como em público - onde a piscina surge como território decisivo -, "Naissance des Pieuvres" incide também nos dilemas que moldam e influenciam a construção das suas personalidades, o que leva a que os laços de amizade sejam cada vez mais voláteis, ainda que dolorosos, sobretudo quando se confundem com outras emoções.

Céline Sciamma concede a esta história de auto-descoberta uma tridimensionalidade invejável, para a qual contribuem as muito convincentes interpretações do jovem trio de actrizes e uma atmosfera realista e intimista, fruto de um sóbrio trabalho de realização e fotografia.

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