E pronto, a barreira do quarto de século foi ultrapassada, e já me encontro mais perto dos 30 do que dos 20. Mas mesmo estando a aproximar-me da suposta crise que daí advém, enquanto tiver gente como a Shirley, a Björk ou as meninas das Cibo Matto a cantar para mim, vou continuar a festejar:
Se dúvidas houvessem, os Interpol provaram ontem que são uma das bandas actuais que melhor incorpora a herança do pós-punk, sensação que já havia sido sugerida no disco de estreia, "Turn on the Bright Lights" (2002), reforçada em "Antics" (2004), e apenas levemente colocada em causa em "Our Love to Admire" (2007), o disco mais recente, que acusou alguma estagnação na sonoridade do quarteto nova-iorquino, mesmo não deixando de concentrar uma série de boas canções. E foi de grandes canções que viveu o alinhamento de um esgotadíssimo concerto do Coliseu de Lisboa, a confirmar o crescente mediatismo de uma banda que já ganhou lugar cativo na lista de essenciais do rock actual, e prova disso foi o modo efusivo como alguns dos temas foram recebidos, demonstrando que os Interpol possuem na sua discografia meia dúzia de hinos urbanos.
O arranque, com "Pioneer to the Falls", que também é o primeiro tema do novo disco, cativou pela imponência, mas com canções mais antigas, como "Say Hello to the Angels", "Narc" e "Obstacle 1", logo a seguir, é que a banda acendeu um rastilho que a levou a resultados explosivos, e que de resto preencheram grande parte do alinhamento.
O desequilibrado "Our Love to Admire" não teve, felizmente, muito mais espaço do que os dois álbuns anteriores, e todos foram devidamente representados por pela maioria das melhores composições do grupo. Não faltou a pujante "Slow Hands", com um refrão que não deu descanso aos corpos de muitos dos que dançaram na plateia, nem outros pontos altos de "Antics" como a irresistível "Evil" ou a belíssima canção de amor que é "C'Mere", cuja ressonância emocional foi visível.
Nem todos os temas mais recentes conseguem atingir esse impacto, mas os que o concerto incluiu resultaram bem, tanto "Mammoth", com o seu atípico compasso dinâmico, como o abrasivo "Heinrich Maneuver", o dolente "No I in Threesome" e sobretudo "Rest My Chemistry", o melhor momento de "Our Love to Admire".
O encore sublinhou o carisma e consistência de um grande espectáculo, com "Take You on a Cruise", a muito aguardada "Stella Was a Diver and She Was Always Down" e a certeira "PDA", esta última com direito a uma extensão instrumental de guitarra e bateria, que alargou o apelo dançável presente na maioria do concerto e fechou da melhor forma uma clara prova de solidez.
Antes do óptimo concerto dos Interpol, a noite começou com uma primeira parte à altura, a cargo do trio italo-japonês Blonde Redhead, também sediado em nova-iorque embora praticante de um rock mais etéreo e onírico, suportado por atmosferas intrigantes e pelas convincentes vozes de Kazu Makino e Amadeo Pace.
Temas do aclamado "23", o seu mais recente álbum, dividiram o protagonismo com recordações de registos anteriores, num aquecimento durou pouco mais de meia hora mas chegou para comprovar que não eram poucos os conhecedores do grupo. Quem não conhecia teve em momentos como "Equus", "23" e principalmente "Spring and by Summer Fall" (uma das mais apaixonantes canções de 2007) excelentes portas de entrada para uma banda que, tal como a de Paul Banks, merece um concerto em nome próprio por estes lados.
E O VEREDICTO É: 4/5 - MUITO BOM
Fotos: Vera Moutinho
Cruzamento brilhante entre melancolia, excitação e sentido de urgência, a hora e meia servida pela banda ganhou ainda pelo cuidado cénico, que se reflectiu nas recorrentes projecções e nas mudanças de tonalidades de canção para canção, entre azulados e violetas ou em estratégicos episódios surpreendentes como a explosão de luz na contemplativa "Lighthouse".
Se na sua estreia em Portugal, na última edição do festival Super Bock Super Rock, muitos acusaram o quarteto de adoptar uma postura demasiado fria e distante, nesta nova visita o grupo não foi propriamente caloroso mas demonstrou simpatia através dos frequentes agradecimentos emitidos pelo vocalista Paul Banks - nem faltou o obrigatório "obrigado" - ou dos seus elogios a Lisboa. Antes isto do que tagarelices forçadas e dispensáveis, até porque no que realmente interessa - a música - o desempenho dos Interpol foi inatacável, exibindo uma evidente coesão, com uma segurança instrumental invejável e uma não menos envolvente entrega vocal de Paul Banks.