Foi por estes temas que se desdobrou a conversa que eu e o Eduardo Santiago tivemos com Jorge Palma, que partiu do seu disco mais recente, "Voo Nocturno", e foi parar a contratos publicitários, Jim Jarmusch ou telenovelas. Fica para ver aqui em baixo:
O concerto estava esgotado há já vários dias e a ocasião parecia justificá-lo. Afinal, era a primeira vez que a música de Jorge Palma surgiria acompanhada por um quarteto de cordas a cargo de Alexander Stewart, Regina Aires, Alexandre Delgado e Guenrikh Elessine, os quatro elementos do Quarteto Lacerda.
A conjugação da habitual guitarra e piano do cantor/compositor com dois violinos, violeta e violoncelo partiu do convite do Centro Cultural de Belém, que lhe deu carta branca para apresentar o alinhamento que quisesse no formato que entendesse.
As expectativas eram por isso consideráveis, e se em alguns momentos foram atingidas noutros tantos nem por isso, pois apesar da inegável competência técnica de todos os que pisaram o palco o resultado não foi tão surpreendente como a ideia inicial sugeria.
Embora a colaboração inédita fosse um bom ponto de partida para que as canções de Palma aceitassem novas contaminações - sobretudo da música clássica, que de resto também marcou a sua formação, mais centrada no rock -, o papel do quarteto foi mais o de se colar às estruturas das canções do que potenciar novos rumos ou recontextualizações.
Houve algumas excepções, como na óptima "Valsa de um Homem Carente", talvez o momento mais intenso da noite, mas no geral a mais-valia do quarteto esgotou-se ao fim de poucos temas, uma vez que o seu contacto com estes não sofreu grandes variações e acabou por gerar um alinhamento demasidado homogéneo, sobretudo na primeira metade do espectáculo.
Após a primeira meia hora os resultados foram mais estimulantes, curiosamente aqueles em que Palma actuou a solo, ao piano, nos obrigatórios "Frágil" e "Dá-me Lume", onde provou que afinal a sua música nem precisa de rendilhados, funcionando muito bem num formato minimalista e menos polido.
Igualmente convincentes foram os momentos em que partilhou o palco com o seu filho Vicente, quer para interpretar "Abrir o Sinal", um dos poucos os mais recente álbum, "Voo Nocturno", presentes no concerto, ou o emblemático "O Bairro do Amor".
Não foi por acaso que alguém do público gritou "Filho de peixe!", já que Vicente Palma criou uma das melhores versões do disco de tributo a Adriano Correia de Oliveira, editado há poucos meses, e ontem reforçou a boa impressão quer como pianista, guitarrista ou cantor.
Episódios como estes compensaram alguns dos primeiros da noite, mas os desequilíbrios regressaram na altura do encore, que apostou no omnipresente "Encosta-te a Mim", o single do último disco que já se tornou num dos maiores êxitos de Palma.
Nada contra, excepto o facto de que o tema já tinha constado do alinhamento do concerto, e ainda que tenha sido bem acolhido pelos espectadores nas duas ocasiões foi um desperdício repeti-lo quando há tantas canções do músico que ficaram de fora.
Pior foi o facto do encore contar apenas com mais outra canção, "Finalmente a Sós", encerrando abruptamente um espectáculo que estava, aos poucos, a tornar-se mais interessante e que assim não durou mais de uma (curta) hora.
Mesmo assim, a julgar pela frequência dos aplausos e em especial pela ovação no final, em que muitos fizeram questão de se levantar das cadeiras, esta "Carta Branca a Jorge Palma" foi um concerto que encheu as medidas da maioria dos presentes, e os muitos comentários que envolviam adjectivos como "excelente" e "fantástico", à saída, reforçaram essa impressão.
Talvez a boa aceitação encoraje a repetição de uma iniciativa semelhante, de preferência onde as canções de Palma sejam melhor aproveitadas numa actuação mais longa.