A tradição já não é o que era
Cinco amigos, estudantes universitários, decidem passar um fim-de-semana numa casa isolada, perdida numa floresta, só que nem tudo corre bem. Antes pelo contrário: corre tão mal que o grupo se arrisca a não sobreviver à primeira noite, num retiro com muito pouco de idílico.
Enquanto premissa para um filme, esta descrição está longe de ser original e é tão genérica como o título da estreia na realização de Drew Goddard, "A Casa na Floresta". Mas se tivermos em conta que o norte-americano, antes de se aventurar como realizador, foi argumentista e colaborador de J.J. Abrams ou Joss Whedon, deixando os seus créditos em "Lost: Perdidos", "Buffy, Caçadora de Vampiros" ou "Nome de Código: Cloverfield", temos alguns motivos para suspeitar que este repisar dos clichés do teen slasher oferece mais do que o que sugere à partida (até porque Whedon dá uma ajuda na escrita e na produção).
De facto, "A Casa na Floresta", que chegou a salas nacionais envolto em algum hype (não faltando quem o aponte como o melhor filme de terror em muitos anos), dá uma no cravo e outra na ferradura: é reverente aos códigos do género durante quase toda a primeira metade (mesmo que vá deixando no ar algumas interferências fora da caixa) e tenta desconstrui-los quase todos na segunda, quando mostra realmente ao que vem. O esforço é curioso, e saúda-se, e a ambição chega a ser desmesurada... Já o resultado, de tanto querer salientar a habilidade e o savoir faire pós(pós-pós)-moderno do argumento, convence mais enquanto exercício de estilo vistoso - e sim, habilidoso - do que como experiência emocionalmente satisfatória.
O terror acaba por ir dando lugar ao humor negro e o efeito paródico, que também aponta o dedo à forma como a violência é trabalhada (e devorada) não só no cinema, torna as personagens em reféns de um jogo sempre muito auto-consciente, embora irregular: entre demasiadas sequências apenas funcionais, "A Casa na Floresta" dispara um trunfo tão genial quanto desbragado em 10 ou 20 minutos que sabem tirar partido, como nenhum outro segmento do filme, da colisão (literal) de arquétipos (dizer quais já seria entrar no campo do spoiler...). Claro que, depois de um momento tão desconcertante, cocktail lúdico mais livre e com mais ideias do que muitos filmes inteiros, Goddard não sabe muito bem como rematar a acção e o desenlace volta a esmorecer. "Gritos 4", por exemplo, foi dos filmes mais subestimados do ano passado e era capaz de apresentar, num campeonato semelhante, outro equilíbrio e concisão do princípio ao fim. Mas aqueles 10 ou 20 minutos...