Máquina mortífera (mas ligeirinha)
O trailer levava a desconfiar que "Homem de Ferro 3" teria mais em comum com o Batman de Nolan - para muitos, o modelo a seguir nas adaptações cinematográficas de super-heróis - do que com as duas aventuras anteriores do alter ego de Tony Stark no grande ecrã. O filme até nos mostra o protagonista a sofrer ataques de ansiedade (consequência directa do confronto alienígena de "Os Vingadores") e a revelar um lado vulnerável que a armadura não disfarça - até porque nem sempre está disponível - enquanto lida com uma ameaça global mais baseada na realidade do que poderia esperar-se (colocando em jogo o terrorismo, a manipulação genética ou o antiamericanismo).
Felizmente, a terceira aventura no cinema do milionário playboy mais popular da Marvel está longe de ser tão sisuda como "O Regresso do Cavaleiro das Trevas" já que Shane Black, o novo realizador de serviço, mantém o tom lúdico e espirituoso da abordagem de Jov Favreau. A mistura de comédia e acção não é estranha vinda de alguém que se estreou na realização com o divertido "Kiss Kiss Bang Bang" (também protagonizado por Robert Downey Jr., ainda a recuperar de uma fase menos feliz da sua carreira) e que tinha escrito "Arma Mortífera".
Um currículo destes permite antever as ambições de "Homem de Ferro 3", mais preocupado em funcionar como filme-pipoca despretensioso e não tanto em mergulhar a fundo nos temas mais densos sugeridos pelo argumento. E se em geral a fórmula funciona (sim, este é um filme de fórmula, o que no caso não é necessariamente mau), Black também deita abaixo alguma força ao apostar numa overdose de gags por vezes intrusivos - por cada diálogo oportuno, com ironia e distanciamento q.b., há outro a intrometer-se na construção de uma tensão dramática que nunca chega verdadeiramente a instalar-se.
"Homem de Ferro 3" tem mais alguns trunfos enquanto espectáculo visual, com o realizador mostrar que, além de ter ouvido para os diálogos, também se sai bem na confecção de sequências de acção empolgantes - e aí o ataque à mansão de Stark ou um habilidoso resgate em queda livre são dignos de menção especial. Menos inspirado, o clímax não só recorre a uma preguiçosa solução deus ex machina (será mais um exemplo de ironia, tendo em conta o super-herói em questão?) como traz à memória os momentos mais estridentes e mecânicos da saga "Transformers" (ainda que Black seja bem mais desenvolto do que Michael Bay na gestão de pancadaria).
O desfecho pouco inventivo também leva a que o destino de Tony Stark (mais uma vez, um protagonista indissociável de Robert Downey Jr.) e Pepper Potts (Gwyneth Paltrow, agora com mais tempo de antena) dificilmente surpreenda, mas ao longo do filme Black preocupa-se em fazer com que a relação evolua face ao apresentado nos episódios anteriores. Os secundários é que não têm a mesma sorte - Don Cheadle e Rebecca Hall, com desempenhos melhores do que as personagens, poderiam facilmente ter ficado de fora, e Ben Kingsley e Guy Pearce são antagonistas aceitáveis mas vítimas de um twist com tanto de curioso como de frustrante.
Entre o conseguido e o nem por isso, "Homem de Ferro 3" ainda acaba por ser entretenimento superior à média blockbuster e uma boa porta de entrada para uma temporada cheia deles - só não é o tal grande filme de uma saga que continua, mais uma vez, à sombra das de outros companheiros de editora.