Orgulho, preconceito e publicidade enganosa
Teoricamente, "Interior. Leather Bar" pretende imaginar como seriam os 40 minutos censurados - e nunca revelados - de "A Caça" (1980), o filme de William Friedkin, protagonizado por Al Pacino, que gerou controvérsia pelo mergulho em ambientes gay nova-iorquinos numa época em que a homossexualidade estava (ainda) mais afastada do cinema mainstream.
Na prática, esta colaboração entre Travis Mathews (realizador de ficção e documentários queer) e James Franco (que dispensa apresentações e dá mais um passo à frente e atrás das câmaras) acaba por trocar as voltas ao espectador que procure novas pistas sobre a narrativa desse policial. Aqui a história é outra e, em vez de um assassino em série, vai atrás dos limites entre a realidade e o artifício, o (falso) documentário e a ficção, a pornografia (gay) e o cinema "sério" ou a forma como a sexualidade de um actor pode influenciar a sua entrega a um papel.
Quem for à espera de encontrar James Franco eufórico numa discoteca gay hardcore depara-se, então, com o filme errado e o próprio filme chega, aliás, a brincar com essa eventual frustração de expectativas. O problema de "Interior. Leather Bar" é que o seu atrevimento temático e formal não vai além de um jogo orgulhosamente auto-consciente, tão espertinho quanto presunçoso, sobretudo quando mostra as costuras passados 20 ou 30 minutos (a partir dos momentos em que se percebe que este "filme dentro do filme" se esgota em si mesmo e que o making of é mais escrito do que espontâneo).
Pelas questões que coloca em cena, este híbrido dificilmente seria um filme nulo, mesmo que valha mais pelas intenções do que pela reflexão em si. Às vezes, até parece pouco mais do que uma ego trip de James Franco ancorada na denúncia de um mundo heteronormativo, em que até a arte (e mais especificamente o cinema) fica refém de preconceitos. A discussão podia ir longe, mas aqui reduz-se a um libelo demasiado didáctico, ao qual nem a lógica metareferencial dá outro fôlego ou profundidade.