"Carpe Jugular" foi das melhores surpresas de "Age", o disco mais recente dos Hidden Cameras, ao deixar de lado a pop de câmara associada aos canadianos e procurar inspiração na pista de dança - não só pela moldura electrónica (linhagem anos 80) mas também pela própria letra, crónica de corações partidos em ambiente hedonista.
Escolhida, e bem, como novo single do projecto de Joel Gibb, a canção ganha agora ilustração quase literal num videoclip certeiro. O jogo de olhares e movimentos, entre a sedução e a agressão, dá outra força ao que já era um belo exemplar de synth pop negra, embora com margem para sarar as feridas neste complemento visual:
Num mundo perfeito, os Bis teriam tanta atenção como uns Franz Ferdinand, também eles de Glasgow, também eles inspirados pelo pós-punk. No mundo que temos, a banda de Manda Rin, John Disco e Sci-fi Steven (como não simpatizar com gente com nomes destes?) conta apenas com uma canção que poderá aproximar-se de um hit: a do genérico final da série das Powerpuff Girls (como não simpatizar com gente que fez música para a era dourada do Cartoon Network?).
Dificilmente será "Data Panik Etcetera", o novo disco, a mudar muito as coisas. Antes pelo contrário, este quarto álbum até tem passado mais despercebido do que os anteriores, o preço a pagar por uma separação no início do milénio que resultou em projectos - individuais ou em grupo - ainda mais discretos. Neste regresso, os Bis juntam canções novas, dão outra cara a algumas raridades e repescam temas dos Data Panik, grupo que formaram depois da dissolução ao lado de outros músicos. E o que poderia soar a uma manta de retalhos requentada é um dos discos mais frescos dos últimos tempos, além de uma das pouquíssimas revisitações recentes do pós-punk com identidade e garra.
B-52's, Human League, Talking Heads ou Blur (em alguns piscares de olhos à britpop) continuam a ser referências inegáveis, mas não há mal nenhum nisso quando temos tantas viragens e surpresas pelo caminho, desde a forma como as vozes masculina e feminina se revezam entre o protagonismo e os coros ao contraste instrumental comparável, num braço de ferro entre o orgânico e o electrónico a reforçar o apelo físico - a sequência "Flesh Remover"/"(That Love Ain't) Justified"/"Insider", lá para o final, amparada na percussão, é especialmente transpirada e estonteante.
"Data Panik Etcetera" é um óptimo candidato a disco deste Verão, mas há mais uns quantos álbuns a reter do primeiro semestre de 2014. Abaixo recordo 15, embora a colheita inclua outros que merecem ser ouvidos do princípio ao fim, ou que raramente pedem o salto para a faixa seguinte. Um balanço mais memorável do que o cinematográfico, talvez o mais fraco dos últimos anos - a absurda quantidade de estreias, inversamente proporcional ao tempo de cada filme nas salas, também não ajuda nada. Os palcos pareceram mais apelativos, mas ficou muita coisa por ver. Mesmo assim, Silence 4, Warpaint e Arcade Fire deixaram três concertos para não esquecer tão depressa. Ao lado de uma dezena de canções à altura, fica feito o top 40 dos últimos seis meses, sem ordem de preferência.