"Goodbye Future", o single que os Presets editaram no início do ano, parecia ser premonitório. Não só a canção não dava grandes motivos para celebrar o regresso da dupla australiana como sucedeu ao também pouco memorável "Pacifica" (2012), um terceiro álbum aquém dos antecessores.
O futuro do projecto de Julian Hamilton e Kim Moyes não inspirava, por isso, grande entusiasmo, mas "No Fun" ainda vem a tempo de retomar a urgência dos dias de "Apocalypso" (2008). Mesmo sem um impacto tão efervescente como "My People" ou "This Boy's in Love", o novo single serve quase seis minutos de um electro com dinâmicas mais intrigantes do que as últimas canções do duo, mérito de um balanço viciante entre ambientes robóticos controlados e a euforia de teclados do refrão.
E se a canção é boa (e já conta com uma interessante remistura dos RÜFÜS), o videoclip interactivo é ainda melhor. A experiência criada pelo realizador Barnaby Roper, em colaboração com o Google Play, propõe ouvir o tema através de um cubo com seis misturas diferentes, cada uma acompanhada de um vídeo específico. O resultado é surpreendente e a combinação de sons e imagens praticamente inesgotável. Vale bem a pena perder uns minutos por aqui.
Quem, ainda assim, sentir falta de um videoclip mais convencional, pode espreitá-lo abaixo, com uma selecção de algumas sequências do formato interactivo, entre pistas de dança frenéticas, casas de banho soturnas e passeios ao fim da tarde. Aviso: embora eficaz, é muito menos divertido.
Depois de um filme tão barroco e exasperante como "Laurence para Sempre" (2012), era legítimo recear que o cinema de Xavier Dolan se contentasse em ser uma montra de efeitos e maneirismos - até porque a tentação exibicionista também já tinha passado por "Amores Imaginários" (2010), outro drama com mais estilo do que substância deslumbrado com uma colecção de citações cinéfilas.
Terminada a trilogia centrada em amores impossíveis - que arrancou com "J’ai Tué Ma Mère" (2009) -, "Tom na Quinta" talvez não encerre as opiniões polarizantes em torno do jovem realizador canadiano - se Cannes sempre o apoiou, alguma crítica ainda se mantém de pé atrás -, mas deixa motivos para que seja levado mais a sério.
Sem abdicar da vertente de exercício de estilo, esta entrada no thriller psicológico ambientada numa pequena localidade do Quebeque deita fora boa parte do artifício, com um minimalismo por vezes inesperado, e essa concisão a jogar quase sempre a seu favor deverá alguma coisa à peça de teatro homónima de Michel Marc Bouchard, aqui adaptada.
O que começa por parecer um filme sobre o luto esbarra com códigos do cinema de terror numa abordagem intrigante à síndrome de Estocolmo quando Tom, o protagonista, vai entrando numa relação tensa e ambígua com o irmão do seu ex-namorado - que tenta esconder da comunidade, e sobretudo da mãe, qualquer vestígio da homossexualidade deste durante o seu funeral. Tom adere ao jogo, mas à medida que a estadia na quinta se torna mais longa a quantidade de situações-limite vai aumentando, com o fantasma da homofobia sempre presente e a camuflar o despontar do desejo (mais sugerido do que sublinhado) com uma dependência violenta e doentia.
Capaz de manter um sentido atmosférico impecável, "Tom na Quinta" vive muito do cenário rural agreste e isolado que Dolan filma com nervo, mas preferindo a contenção ao espalhafato. Desta vez não há, por isso, tentativas de videoclips de pop electrónica (que preenchiam parte considerável de "Laurence para Sempre"), embora Tom não abdique de uma farta cabeleira loura quase na linha de Martin Gore, dos Depeche Mode, a fazer pendant com as plantações de trigo - paisagem de terror clássica a acolher uma obrigatória cena de perseguição, agora em modo queer, com pulsão homoerótica.
O elenco, encabeçado pelo próprio Xavier Dolan, está à altura do jogo psicológico. Pierre-Yves Cardinal, austero e magnético, sabe complementar a vulnerabilidade e hesitação do protagonista enquanto Lise Roy, na pele da mãe, compõe uma figura desolada pela perda e algo demente pelo estado de negação.
Apesar da solidez plástica e humana, "Tom na Quinta" não consegue fugir a algumas incoerências do argumento na recta final, lembrando que o também relativamente recente "O Desconhecido do Lago", por exemplo, percorreu território próximo com outro rigor e maturidade. Mas também deixa claro que Dolan é mais do que um esteta habilidoso, funcionando ainda como uma óptima forma de abrir caminho para o novo filme do canadiano: o mais aplaudido "Mommy", último Prémio do Júri de Cannes ex-aequo com "Adieu au Langage", de Godard - empate que gerou outra controvérsia numa carreira a prometer juntar mais algumas...