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gonn1000

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Queer pop

Jack Colwell

 

Com formação clássica e um interesse comparável ou até maior pela pop, JACK COLWELL elege como heróis pessoais nomes como Rufus Wainwright ou Elton John: em parte pela música, em parte por ter aprendido a lidar com a sua homossexualidade através dos relatos deles. "Gay é a última coisa que queres ser quando és adolescente", confessou o australiano à revista i-D.

 

Ultrapassados esses tempos, o cantautor e multi-instrumentista de 25 anos tem vindo a acrescentar à lista de favoritos cada vez mais vozes femininas - Kate Bush, PJ Harvey, Tori Amos, Björk -, não necessariamente enquanto influências da sua música, mas pelo menos como exemplos de integridade artística. Talvez não por acaso, as canções que tem composto e interpretado, a solo ou com os The Owls, aproximam-se dos amores desencantados e rispidez emocional habituais na obra dessas referências, até porque o seu percurso amoroso - e não só - tem sido atribulado q.b..

 

"A minha única via foi fechar-me até ser tão doloroso que tive de quebrar. A única forma de o fazer foi atirar-me ao fogo, queimar-me e tentar ver se conseguia sair do outro lado", contou também em entrevista.

 

Pode dizer-se que, por agora, o desafio foi superado, tanto que Colwell já se sente suficientemente à vontade para gravar o novo videoclip numa sauna gay de Sidney. Ainda assim, com contenção, uma vez que o elemento mais intenso da experiência é mesmo a voz gutural e os arranjos imponentes de "DON'T CRY THOSE TEARS". O novo single está longe da folk discreta dos primeiros dias e prefere abraçar uma indie pop sumptuosa, com laivos dos anos 50, angústia blues e coros soul de coração (e peito) cheio.

 

A canção é também o avanço mais recente do EP "Only When Flooded Could I Let Go", cujo título se adivinha autobiográfico. A julgar pela amostra, parece ficar bem ao lado de temas de Oscar ou Gabriel Bruce:

 

 

Pequena mas trabalhadora

Depois da festa de "Hands" (2009) e da melancolia de "Nocturnes" (2013), a LITTLE BOOTS de "WORKING GIRL" quer mostrar serviço. E por isso repesca o título da comédia de Mike Nichols protagonizada por Melanie Griffith para dizer que, quase trinta anos depois desse filme, as mulheres nem sempre são levadas a sério, sobretudo no meio laboral.

 

little_boots_working_girl

 

Se noutras cantoras pop o feminismo pode ser só mais um crachá fashion, Victoria Hesketh não só sabe elaborar sobre assunto como pôs fim a muitas imposições da indústria - tanto sobre a sua imagem como a sua música - ao criar uma editora, On Repeat Records. Perdeu uma via mais imediata para a popularidade (alimentada por distinções como a da tabela BBC Sound of 2009), conquistou a independência criativa de que dá provas no seu terceiro álbum, facilmente o mais coeso, embora também sem tantos picos como os antecessores.

 

Menos devedor das aproximações à synthpop e electro da estreia, mais orelhudo que que um segundo álbum a colocar o ritmo à frente da melodia, "WORKING GIRL" mantém a receita house do registo anterior mas conta com uma paleta mais versátil - e decididamente mais pessoal do que a união de pop e música de dança de uns Disclosure.

 

"No Pressure", "Heroine" ou a faixa título garantem eficácia nas pistas, "Better in the Morning" e "Taste It" abrandam em modo spoken word lúdico, "Get Things Done" traz um acesso disco que lembra as comparações a Kylie Minogue na altura da estreia (também recuperadas em "Desire", canção escondida mas recomendável). A voz, a composição e a produção continuam a apontar para outra referência habitual, os Saint Etienne, ainda que em temas como "The Game" LITTLE BOOTS ganhe a Madonna no seu próprio jogo revivalista (com toque eurodance a sugerir audições de Ace of Base).

 

A lista de influências prováveis é longa, a de produtores também (Com Truise ou Jas Shaw, dos Simian Mobile Disco, ajudaram), mas como mulher de negócios competente, a cantora britânica gere esses recursos de forma a consolidar o apelo do projecto. A sinergia é especialmente conseguida nas quebras e acelerações de "Business Pleasure", canção sombria e urbana, no frenesim quase Hi-NRG de "Real Girl", talvez o momento mais infeccioso do álbum, e no oásis pop de "Paradise", fresquíssima conjugação de balada electrónica e sugestão dançável. Bom trabalho, sim senhora...

 

 

 

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