"Ride Your Heart" (2013), a estreia das BLEACHED, não era o álbum mais original do mundo. Antes pelo contrário, era mais um a fazer uma vénia aos girl groups dos anos 50, repensada em contexto indie rock, na linha do que fazem ou fizeram umas Dum Dum Girls, Best Coast ou Vivian Girls sem chegar aos melhores momentos destas. Mas ainda era uma amostra promissora das capacidades das irmãs Jennifer e Jessie Clavin, ex-Mika Miko, com uma mão cheia de melodias e harmonias vocais que iam ficando no ouvido.
Três anos depois, e agora em formato trio, ao lado da baixista Micayla Grace, as californianas não parecem ter perdido o jeito para singles despachados, directos ao assunto, e refrãos fortes. "KEEP ON KEEPIN' ON" é uma rajada de três minutos e meio a convocar palmas, segundas vozes e teclados carregados lá para o final, que destoam q.b. do molde talvez demasiado reconhecível do arranque, marcha garage pop comandada por guitarra e bateria.
A dupla Clavin garante que o grupo foi a sua tábua de salvação durante um período atribulado, tanto no plano amoroso como no doméstico, e traduziu parte desses episódios para o disco a editar dia 1 de Abril. O single trata de abrir o apetite com um incentivo à resiliência, numa canção urgente e com garra sem precisar de abdicar do charme. A atitude continua no videoclip, montra para um trio em modo imparável:
Onde termina a homenagem e começa a colagem? No caso de "STAR WARS - O DESPERTAR DA FORÇA", é difícil traçar a fronteira. E esse nem é o único problema de um filme tão aguardado quanto desapontante...
Seja num original como "Super 8" ou na revitalização da saga "Star Trek", o apreço de J.J. Abrams por histórias de ficção científica apontadas a públicos de várias gerações, com uma reverência óbvia por alguns clássicos dos anos 80, fez dele uma aposta natural para relançar aventuras de jedis e sabres de luz. E até aí nada contra, mesmo com um tropeção como "Além da Escuridão: Star Trek" pelo caminho.
Infelizmente, essa sequela, até agora o patamar mais baixo do seu currículo como realizador, tem agora concorrência à altura com um filme que tenta fazer a ponte entre convertidos e novatos. Mas apesar de algumas caras novas, "STAR WARS - O DESPERTAR DA FORÇA" pouco mais faz do que capitalizar nostalgia, com a colagem abusiva à obra inaugural da saga a comprometer o espírito de descoberta que fez dessa uma surpresa há quase 40 anos (e se muitos poderão reduzi-la a um pastiche de outras aventuras galácticas, na altura conseguiu fazê-lo com uma espectacularidade que mora longe do novo episódio, mais um entre tantos blockbusters de orçamento generoso).
As novas personagens até prometem, o filme é que não faz muito com elas. Rey e Finn são defendidos por dois jovens actores empenhados, com alguma química, mas a protagonista acaba por tornar-se em pouco mais de uma marioneta para reviravoltas do argumento, com a função de heroína intrépida e desenracasda. Precisamos de mais uma variação de Katniss, de "Os Jogos da Fome", ou Furioza, do último "Mad Max" (para não recuar mais)? Agradecemos, claro, personagens femininas com papéis de relevo, só que o esforço de Daisy Ridley não disfarça a heroína meio genérica que lhe dão (envolvê-la num novelo de segredos também não ajuda). Como ela, Finn desperta alguma simpatia, mas o dilema moral que o conduz é pouco convincente e ainda menos explorado. De qualquer forma, será sempre preferível ao "arco narrativo" de Poe, de longe um dos maiores desperdícios de actores dos últimos tempos - Oscar Isaac a passear pelos cenários sem personagem para agarrar.
Se no caso dos heróis ainda se nota, ainda assim, alguma tentativa de construção dramática - por muito que a maioria dos retornados da velha guarda, tirando um, pouco mais faça do que aparecer -, o mais frustrante deste novo episódio é mesmo o vilão. Como suceder a um ícone do gabarito de Darth Vader? Nunca com o esboço que se serve aqui, numa figura risível quando deveria ser temível. E como ela falha, falha também o suposto grande momento de tensão do filme, lá para o final, a milhas da gravidade que pretende ter (e quanto menos se falar do CGI do Supremo Líder, melhor...). Até porque, depois dessa cena, a aventura retoma a mistura de acção e humor, com as piadinhas da praxe a anularem qualquer construção de suspense. As coincidências fazem o resto, e se já é expectável contar com algumas, aqui o número de situações roça o absurdo - as desculpas para encontros das personagens ou fuga de ameaças seguem quase sempre pelas soluções mais preguiçosas, que deixam sérias dúvidas sobre a revisão do argumento.
Numa coisa, admita-se, "STAR WARS - O DESPERTAR DA FORÇA" não falha: Abrams consegue manter o ritmo ao longo destas mais de duas horas, mais enérgicas do que arrastadas, e até chega a entusiasmar na primeira metade. Mas bem espremidas, e passada alguma adrenalina, pouco fica: as relações entre as personagens evoluem de modo demasiado acelerado, com laços tão fortes como forçados; a sinalização do que está para trás (seja vénia ou cópia do capítulo inaugural, tanto faz) impõe uma estrutura demasiado reconhecível; e nem as sequências de acção chegam a ficar na retina (muito fogo de vista, muito dinheiro gasto, nenhum momento de antologia). Fica só mesmo um prólogo de longa duração, que se limita a lançar pistas para seguir nos próximos dois episódios. E nem sequer o disfarça, ao despedir-se com um cliffhanger na linha do pior cinema em série. Desta vez, a força não esteve com J.J. Abrams...