Convém ficar de pé atrás em relação ao que parte da imprensa musical britânica tem escrito sobre o segundo álbum dos WOLF ALICE. "Visions of a Life", que chega às lojas esta sexta-feira, já é apontado como a "obra-prima" (garante a Drowned in Sound) da "melhor banda do Reino Unido" (complementa a NME), epítetos que talvez obriguem alguns incautos a depositar expectativas desmesuradas no quarteto londrino.
Mas a banda liderada pela carismática Ellie Rowsell não merece esse peso nos ombros, sobretudo quando elogios superlativos como estes dão muitas vezes lugar ao desprezo ou esquecimento uns álbuns mais à frente (mesmo que o peso da imprensa musical de terras de Sua Majestade já não seja comparável ao dos dias da britpop e das quezílias Blur/Oasis).
Na verdade os WOLF ALICE não inventam nada, embora seja tentador simpatizar uma banda que resgata tão bem alguns ambientes do pop-rock alternativo de meados dos anos 90 sem se limitar a modelos copistas. As influências de nomes como os Belly ou os Elastica, entre outros grupos de guitarras com vozes femininas, já se notavam em canções como "She" ou "Blush", mantiveram-se em "Moaning Lisa Smile" e condensaram-se no álbum de estreia - "My Love Is Cool", de 2015, que também abria pistas para domínios da folk.
Até agora, os horizontes do novo disco não parecem muito diferentes. "Yuk Foo", o single de apresentação, mostrou os britânicos mais espevitados do que o habitual, com uma urgência entre o punk e a escola riot grrrl. "Don't Delete the Kisses" repescou a candura presente em alguns dos melhores momentos da banda, numa das suas canções mais envolventes, em atmosfera dream pop. A breve "Beautifully Unconventional", mais directa, sugeriu heranças dos girls groups dos anos 50 e 60, com Ellie Rowsell a dar novas provas de versatilidade. E "Heavenward", o cartão de visita mais recente, aposta num cuidado textural que convoca o shoegaze de uns Lush.
Avanços geniais? Nem por isso, mas também não são nada maus e até é seguro dizer que quase metade do álbum está ganho. Haja tempo para ir conhecendo o resto, sem deslumbramentos nem histerias precoces em busca da next big thing britânica:
Ao ir do confronto ao conforto, "QUANDO SE TEM 17 ANOS" não anda longe de outros dramas boy meets boy mas também vai comprovando que quem sabe nunca esquece: é um belo regresso de André Téchiné às salas nacionais.
A história de dois adolescentes cuja relação começa em modo conflituoso e que aos poucos se vai tornando próxima, com a amizade a abrir caminho para algo mais, não será território novo nem no cinema queer em geral nem no de André Téchiné em particular. Afinal, essa já era a premissa de um dos filmes mais amados do realizador francês, "Os Juncos Silvestres", há mais de 20 anos (estreou em 1994), drama que inspirou outras abordagens ao despertar (homos)sexual e que é difícil não relembrar ao seguir os protagonistas de "QUANDO SE TEM 17 ANOS".
Mas se o ponto de partida é semelhante, voltando até a contrastar dois rapazes de um meio pequeno (uma localidade nos Pirinéus franceses) com origens sociais distintas, e se o argumento volta a guiar-se por uma narrativa clássica (novamente pautada pelo ritmo das estações do ano), o resultado ainda consegue oferecer uma frescura e desenvoltura que não são de deitar fora.
O cineasta veterano (já com 74 anos) continua a ser capaz de assinar dramas credíveis e de uma subtileza mais evidente do que outros retratos comparáveis, com a atmosfera realista a traduzir-se através de uma conjugação fluída de cenários e personagens, diálogos e atenção ao pormenor.
Desta vez, Téchiné tem entre os colaboradores Céline Sciamma, autora de outros olhares singulares sobre a adolescência ("Naissance de pieuvres", "Maria-rapaz", "Bando de Raparigas") e talvez uma das principais responsáveis para que "QUANDO SE TEM 17 ANOS" esteja uns furos acima de alguns títulos do realizador dos últimos anos (como o apenas competente "O Homem Demasiado Amado", de 2014).
Sem tentar ser um corte ou uma viragem, é sobretudo um drama sólido alicerçado nos desempenhos dos jovens Corentin Fila e Kacey Mottet Klein, convincentes num antagonismo e intimismo à flor da pele, mas também no de uma Sandrine Kiberlain tão hilariante como comovente na pele de mãe de um dos protagonistas - e que acaba por ser a principal instigadora do novelo dramático, mesmo que o seu altruísmo sem reservas quase force a suspensão da descrença do espectador.
A entrega dos actores e o espaço que Téchiné lhes dá ajudam a compensar alguma falta de risco, sobretudo no desenvolvimento da dinâmica dos dois adolescentes, ainda que a abordagem ao bullying escape aos contornos mais expectáveis. Já um evento trágico que abre caminho para um reencontro é demasiado telegrafado e nada incomum em histórias sobre o crescimento, por muito que o filme até o aproveite para um mergulho mais profundo nas personagens e na forma como se relacionam.
Limitações ocasionais como essa fazem de "QUANDO SE TEM 17 ANOS" um drama quase sempre mais agradável do que especialmente apaixonante, mas é difícil não reconhecer um regresso em forma de um realizador que deveríamos ver mais vezes nas salas.
3,5/5
"QUANDO SE TEM 17 ANOS" foi um dos filmes da 21ª edição do Queer Lisboa e tem estreia nacional agendada para 26 de Outubro.