Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

gonn1000

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

A festa e a cidade

É uma das surpresas televisivas da temporada: "SUBSOLO", a nova websérie da RTP, traz um retrato da juventude lisboeta (ou parte dela) mais solto e credível do que grande parte da ficção nacional enquanto mostra como aliar o conceito ao formato. E nem pede muito tempo em troca...

Subsolo

"Verão Danado", o primeiro filme de Pedro Cabeleira, deu que falar no ano passado ao procurar novos olhares sobre jovens portugueses do aqui e agora, com o aqui a centrar-se no lado mais hedonista da noite de Lisboa. E partindo da espontaneidade do elenco e de uma energia visual invulgar no cinema que se faz por cá, conseguiu distinções fora de portas (como no Festival de Locarno), conquistando um espaço próprio no retrato de uma certa juventude urbana e contemporânea - e até aí sem muita expressão no grande ou pequeno ecrã.

Mas Cabeleira não parece estar sozinho, como o confirma a nova aposta da produtora Videolotion, à qual está associado. "SUBSOLO", a terceira websérie da RTP, aproxima-se de alguns ambientes desse filme e volta a mergulhar em alguns espaços da capital pouco frequentados por outras produções - elegendo os arredores da Avenida Almirante Reis como cenário. E até o faz com um equilíbrio que "Verão Danado" não era capaz de manter, já que passava de um arranque envolvente e com rasgo para uma segunda hora repetitiva e exasperante.

Subsolo João

Propondo cinco episódios de pouco mais de dez minutos cada, cada um centrado numa personagem diferente (e todas entre os 16 e os 26 anos), a websérie adopta um formato narrativo em mosaico que, não sendo original, serve bem o olhar amplo q.b. sobre a geração "millennial", nascida depois de 1990. A unir as histórias individuais está uma festa em casa de um dos protagonistas, momento-chave de todos os capítulos que contribuiu para a coesão do conjunto - embora cada episódio possa ser visto isoladamente.

O apelo da festa é, aliás, o motor dos retratos iniciais, o que chega a sugerir que "SUBSOLO" até está demasiado próximo de "Verão Danado", limitando-se a funcionar como mera variação. E, pior, que ameaça escorregar para a irreverência inconsequente de "Casa do Cais", a frustrante websérie anterior da RTP (vendida como a primeira série LGBTQ nacional mas no fundo a resultar numa colecção de estereótipos sem graça nem alma). "Amor Amor", o novo (e meritório) filme de Jorge Cramez, também é outro ponto de contacto possível, sobretudo nas cenas de celebração colectiva regadas a álcool, música e dança.

Subsolo Nazim

Mas como acaba por ir revelando, "SUBSOLO" está afinal pouco interessada em fazer a apologia de um hedonismo desenfreado, embora também se mantenha longe de um moralismo (muito televisivo) que procure condená-lo. Propõe antes um olhar justo e atento de uma Lisboa descrita como "marginal e alternativa", aceitando várias perspectivas narrativas mas também culturais, pessoais e emocionais - através de protagonistas com experiências e prioridades mais vastas do que o início da série dá a entender.

Essa abertura é especialmente conseguida nos dois últimos episódios, centrados num rapaz de ascendência indiana e numa dealer, respectivamente (e com ela, Diana Narciso, a impor-se como uma das presenças mais fortes de um jovem elenco promissor, defendendo uma personagem imune aos clichés de muitos filmes, séries e telenovelas).

Além dos actores e do argumento (que recusa assentar em picos dramáticos, mantendo-se verosímil), o mérito é dos cinco realizadores (Tiago Simões, Joana Peralta, Maria Inês Gonçalves, Victor Ferreira e Marta Ribeiro), cada um a cargo de um episódio mas todos a conseguirem traduzir um realismo à flor da pele, mais cinematográfico do que televisivo, visível na atenção ao elenco ou no lado sensorial dos espaços (sobretudo face a muitas outras apostas da ficção nacional do pequeno ecrã). O resultado talvez não vá mudar a vida de ninguém, mas não se sai nada mal a captar pequenos momentos que vão fazendo a diferença.

"SUBSOLO" pode ser vista na íntegra na RTP Play e no Youtube.

3/5

Apanhem-nos se puderem

Iceage

 

Sem novidades desde 2014, ano da edição do seu terceiro álbum, "Plowing Into the Field of Love", os ICEAGE interrompem finalmente o hiato criativo com um inédito. E "CATCH IT" compensa a ausência dos dinamarqueses com quase seis minutos de uma marcha gótica e psicadélica, que tem direito a viragem rítmica a meio acompanhada de um mergulho mais fundo na distorção.

 

O vocalista Elias Bender Rønnenfel, que nos últimos anos andou mais ocupado com o projecto a solo, Marching Church, reforça o registo denso e volta a dar razão a quem nele viu um discípulo de Nick Cave por alturas do álbum de estreia do grupo, em 2009. Mas apesar de assombrado, o novelo sonoro guiado por guitarras difícies de domar deixa espaço para alguma esperança lá para o final - pelo menos no videoclip da canção, que termina com o actor David Dastmalchian ("Twin Peaks") e a filha em ambiente de calma depois da tempestade.

 

Além do novo single, os ICEAGE anunciaram uma digressão em várias cidades europeias e norte-americanas a partir de Maio (Portugal não está contemplado), mas não há notícias de um quarto álbum a caminho. Em todo o caso, está aqui um dos bons regressos do início de 2018: