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gonn1000

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Fundo de catálogo (110): Beastie Boys

Hello Nasty

22 faixas, mais de uma hora de música e um alinhamento ecléctico como poucos. "HELLO NASTY", o quinto álbum dos BEASTIE BOYS, foi uma surpresa e um triunfo há 20 anos e mantém-se uma ode ao hip-hop de vistas largas.

"Intergalactic" fez jus ao título e foi um fenómeno global. "Body Movin", com a ajuda da remistura do então fresquíssimo Fatboy Slim, não lhe ficou muito atrás. Mas se foram sobretudo esses dois singles que inscreveram "HELLO NASTY" na memória colectiva, houve mais a descobrir num discos muito aguardados do Verão de 1998.

A adição de Mix Master Mike ao trio de Mike D, MCA e Ad-Rock terá influenciado o desvio dos ambientes agrestes q.b. do antecessor "Ill Communication" (1994) para uma colagem lúdica e versátil, a atirar os nova-iorquinos para territórios que dificilmente se antecipariam. O arranque bombástico, com a sequência imparável de "Super Disco Breakin'", "The Move" e "Remote Control", mostrava uns BEASTIE BOYS iguais a si próprios (e no pico da forma), mas a pop esquizóide de "Song for the Man" propunha, à quarta faixa, uma viragem a confirmar em temas como o devaneio electrónico e orelhudo de "And Me" ou o final, também entre a contenção e a explosão, de "Instant Death".

Beastie Boys

Essa conjugação mantém-se ao longo de todo o alinhamento de "HELLO NASTY", que tanto disparou cartadas hip-hop com um flow reconhecível, produção igualmente fluída e atenta ao detalhe (cortesia do cúmplice habitual Mario Caldato Jr.) e scratching a rigor - "Just a Test", "Three MCs and One DJ", "The Negotiation Limerick File" - como mostrou uma banda sem medo de arriscar outros cenários.

A serenidade e languidez de "I Don't Know", na voz de MCA e coros de Miho Hatori (então das Cibo Matto, mais tarde dos Gorillaz), foi das maiores surpresas ao espreitar a bossa nova. O tempero latino, em modo mais ritmado, também passa por "Song for Junior", com o contributo vocal de Jill Cunniff (das Luscious Jackson, outra contratação da Grand Royal, a antiga editora dos BEASTIE BOYS).

"Picture This" propôs um desvio jazzy noir, quase trip-hop, no timbre enigmático de Brooke Williams. E Lee "Scratch" Perry, a fechar a guest list, ocupou-se do episódio dub de "Dr. Lee, PhD", provavelmente o menos aliciante mas que ainda assim não compromete um disco caloroso e generoso, com uma combinação de referências que não acaba numa manta de retalhos. "Hello Nasty, where you been?". Vale a pena voltar a saudá-lo, sobretudo numa tarde de Verão.

Em família que ganha não se mexe

À segunda, a receita ainda se mostra de confiança: "THE INCREDIBLES 2: OS SUPER-HERÓIS" não trai a boa memória do primeiro filme e é dos blockbusters mais inteligentes, adultos e divertidos deste Verão. Mesmo que o filme de Brad Bird também não escape a alguns clichés que contaminam adaptações da Marvel ou da DC...

 

The Incredibles 2

 

Por muito que a Pixar se tenha imposto - por mérito próprio - no cinema de animação das últimas décadas, a aposta nas sequelas esteve longe de ser das mais felizes e louvadas. Muitos dirão que nem "À Procura de Nemo" nem "Monstros e Companhia" precisavam de continuação (ou pelo menos não da forma que acabaram por ter), enquanto que "Carros" terá sido um universo de interesse questionável logo à partida. E se a trilogia de "Toy Story" ficava como a excepção que foge à regra (chegando mesmo a superar-se na recta final do terceiro capítulo), agora já não está sozinha nessa lista.

 

Embora não seja um filme a juntar aos melhores dos estúdios de animação, a sequela de "The Incredibles - Os Super-Heróis" tem a proeza de chegar 14 (!) anos depois sem que a nova aventura pareça requentada, mantendo um saudável equilíbrio entre reconhecimento e surpresa. 

 

Mais do que o anterior, este é, aliás, um filme muito do seu tempo, tanto pela disseminação de sagas de super-heróis que entretanto tomaram Hollywood de assalto como pela óbvia agenda feminista presente no argumento. Mas ao contrário de algumas outras sagas actuais do grande ecrã, cuja motivação sociológica parece combinar (supostas) boas intenções com oportunismo, aqui o papel de maior relevo da Mulher-Elástica surge como um desenvolvimento narrativo mais espontâneo, ou pelo menos mais coerente - até porque esta já era uma "mulher forte" no primeiro filme.

 

The Incredibles 2

 

Quando os super-heróis passam de modelo inspirador a alvo de perseguição, "THE INCREDIBLES 2: OS SUPER-HERÓIS" encontra na matriarca da família Parr a possível salvação para os vigilantes mascarados e atira o marido para as tarefas caseiras, invertendo a lógica do filme anterior. A ideia não é nova (nem sequer no universo da animação, como episódios de "Os Simpsons" ou "F Is for Family" já o comprovaram ao mudarem a dinâmica do casal protagonista), mas é suficientente bem trabalhada para justificar um reencontro com estas personagens, (quase) todas com os seus próprios conflitos por resolver: apenas o filho do meio, Dash, acaba por não ter direito a um arco narrativo.

 

Brad Bird, de novo na realização depois do elogiado "Ratatui" (2007) e dos menos consensuais "Missão Impossível: Operação Fantasma" (2011) e "Tomorrowland - Terra do Amanhã" (2015), tem aqui um regresso à forma ao conseguir gerir personagens, ritmos e tons com muita habilidade e alguma imaginação, sem entrar prego a fundo numa sucessão de malabarismos com superpoderes. Mas deixa-se deslumbrar por eles ocasionalmente, como quando transforma uma boa ideia (visualmente delirante) num recurso de rotina: é o caso das cenas explosivas com o bebé Jack-Jack, que apesar de tudo deixam alguns momentos de antologia.

 

Mr Incredible

 

Uma galeria de secundários valiosos (da sempre hilariante Edna Mode a vários novos super-heróis com capacidades peculiares) e diálogos inspirados estão entre os motivos para regressar à história desta família, ainda que esta sequela vá perdendo algum gás no terceiro acto, quando tem lugar a (inevitável?) grande batalha depois de ter sido revelada a identidade do vilão.

 

Infelizmente, o antagonista não é assim tão misterioso e as motivações também não são as mais convincentes, denunciando o elo mais fraco de um filme bem oleado que acaba por chegar ao final de forma algo mecânica - e a mostrar as maiores (e desnecessárias) afinidades com a produção habitualmente padronizada da Marvel e da DC no cinema. Mas o resultado nem precisa de ser incrível para estar aqui um dos maiores divertimentos deste Verão no grande ecrã - e muito provavelmente o melhor filme de super-heróis do ano.

 

 3/5