Apesar de ter sido uma das revelações mais aplaudidas de 2007, com o álbum de estreia "We Can Create" (nomeado para o Mercury Prize), MAPS foi mantendo um percurso relativamente discreto nos anos que se seguiram.
"Turning the Mind" (2009) e "Vicissitude" (2013), os discos sucessores, confirmaram o interesse de James Chapman, mentor deste projecto de um homem só, por canções de electrónica planante devedora da dream pop e de algum shoegaze, mas desde então pouco se tinha sabido do britânico. Até agora, já que o quarto álbum não só está confirmado como tem título, "Colours. Reflect. Time. Loss.", está prometido para 10 de Maio e chega, como os anteriores, pela Mute Records.
Também já se sabe que o registo vai ser o mais colaborativo do cantor, compositor e produtor, tendo como convidados o The Echo Collective, que agrega músicos com formação clássica, além de vários vocalistas e percussionistas. E a maior inspiração foi o período de recolhimento em Northamptonshire, no interior de Inglaterra, do qual Chapman é originário e onde foi preparando as novas canções ao longo dos últimos três anos - estreando-se como violinista em algumas delas.
"JUST REFLECTING" é um dos temas influenciados por esse quotidiano bucólico e o primeiro inédito de MAPS desde 2013. Mas embora tenha traços de uma viragem orquestral, não é assim tão diferente do que está para trás, ao voltar a contrastar a grandiosidade da melodia e dos arranjos com a voz sussurrada do seu autor. O efeito, mesmo sem ser tão refrescante ou encantatório como algumas canções anteriores, continua bonito e a deixar curiosidade em relação ao próximo passo:
É uma das melhores estreias do início de 2019 e provavelmente a mais prazenteira. Ambientada em dias (e noites) de Verão intermináveis, "MEKTOUB, MEU AMOR: CANTO PRIMEIRO" propõe um virar de página no percurso de Abdellatif Kechiche e apresenta o retrato mais luminoso e sensorial do franco-tunisino.
Depois do jogo de lágrimas de "A Vida de Adèle: Capítulos 1 e 2" (2013), a luz ao fundo do túnel? O sexto filme de Abdellatif Kechiche até oferece mais do que isso, na verdade: luz a céu aberto, com direito a longas tardes de praia num regresso a férias da adolescência que parecem durar para sempre. Talvez por isso "MEKTOUB, MEU AMOR: CANTO PRIMEIRO" insista em prolongar-se por três horas, duração talvez desnecessária (sobretudo nas sequências da recta final, já na discoteca) mas nem por isso a quebrar uma experiência vibrante, com um realizador perfeitamente à vontade no cenário e tom no que adopta aqui.
O cenário nem é, aliás, novidade na obra de Kechiche. A acção regressa a Sète, a pequena localidade do sul de França que já tinha acolhido "O Segredo de um Cuscuz" (2007), esse mergulho ambicioso na comunidade franco-tunisina (a do próprio cineasta), que nos momentos mais conseguidos atingia um embate emocional do qual o novo filme nunca chega a aproximar-se. E também não tenta, nem sequer precisa muito. A praia de "MEKTOUB, MEU AMOR: CANTO PRIMEIRO" é claramente outra e, em compensação, nunca ameaça escorregar para o miserabilismo, mantendo-se imune a lugares comuns de algum realismo social enquanto opta pela faceta mais lúdica da entrada na idade adulta.
O argumento, inspirado no livro "La Blessure, la Vraie", de François Bégaudeau (que também foi referência para "A Turma", de Laurent Cantet), não é particularmente denso mas Kechiche é mais uma vez muito bom a desenhar um microcosmos palpável, assim como a criar personagens e a deixar o espectador intrigado com as relações entre elas (dos graus de parentesco ao novelo acidentado de cumplicidades amorosas).
O protagonista, um estudante universitário com interesse pela fotografia e escrita de argumentos, parece em parte uma extensão do realizador, até porque é o olhar dele que conduz o filme. E é também a presença mais recatada de uma galeria que tem nas personagens femininas as mais estonteantes: sobretudo a de Ophélie Bau, figura voluptuosa e objecto de desejo tanto do protagonista como da câmara, através da qual Kechiche sublinha a sua ode à juventude e à beleza do corpo feminino.
A insistência com que "MEKTOUB, MEU AMOR: CANTO PRIMEIRO" segue as actrizes de forma despudorada q.b. não tem deixado de gerar algumas acusações de misoginia, ainda que seja bem menos gratuita e ostensiva do que as sequências mais controversas de "A Vida de Adèle: Capítulos 1 e 2". E acaba por fazer sentido num olhar tão despretensioso e envolvente sobre as regras da atracção, ambientado num Verão quase idílico de 1994 - iluminado pela espontaneidade e curiosidade, pela união familiar, pela música e dança, por refeições sem tempo e horas, pelo sexo.
Apesar do optimismo face a títulos anteriores de Kechiche, o filme também vai dando conta, sobretudo nos últimos minutos, da ressaca emocional que se segue a uma rotina hedonista e ao (des)apego amoroso, entre a solidão do protagonista (mais um observador do que um participante) e as inquietações de algumas das suas companheiras de festa. Uma viragem que talvez se consolide na continuação, já garantida, e um terceiro capítulo também não está colocado de parte. Mas independentemente do que se seguir, "MEKTOUB, MEU AMOR: CANTO PRIMEIRO" vale por si - e vem juntar-se aos filmes mas valiosos do seu autor.