Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

gonn1000

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Histórias de fé e devoção, entre a guerra e a libertação

Os conflitos religiosos, além de culturais ou políticos, marcam o ponto de partida de três das séries mais aconselháveis do momento: "FAUDA", "KALIFAT" e "UNORTHODOX", todas disponíveis na Netflix.

Fauda_T3.jpg

"FAUDA" (T3): À terceira temporada, a série israelita ainda continua a ser um segredo demasiado bem guardado. E é pena, tendo em conta que esta combinação de drama, thriller e acção criada por Avi Issacharoff, jornalista especializado em questões palestinianas, e Lior Raz, que também se encarrega do argumento e interpreta o protagonista, não perde o fôlego enquanto segue as missões de uma equipa de forças especiais judaicas contra a ameaça terrorista do Hamas. Os episódios mais recentes ainda foram, tal como os anteriores, alvo de algumas críticas pelo olhar parcial sobre o conflito israelo-árabe, mas há que reconhecer que o argumento tem sido cada vez mais moralmente ambíguo, não se coibindo de apontar o dedo à conduta nem sempre exemplar de Doron Kavillio e dos restantes agentes sionistas. Na nova fase, uma missão de resgate em Gaza não só apresenta das maiores situações-limite da série, geridas com solidez narrativa e uma tensão no fio da navalha, como deixa claro o papel do protagonista no alastrar de um ciclo de violência que facilmente transforma vítimas em futuros agressores. Daqui, ninguém sai propriamente a ganhar...

3,5/5

Kalifat.jpg

"KALITAF" (T1): A história de três mulheres com ligações ao Estado Islâmico está no centro deste cruzamento de drama e thriller, uma produção da Filmlance (responsável pela versão original de "The Bridge") para o canal sueco SVT, com distribuição internacional da Netflix. Entre o Ocidente e o Médio Oriente, a série acompanha a mulher de um membro do ISIS, uma agente dos serviços secretos suecos e uma adolescente de Estocolmo seduzida pela organização terrorista. E ao longo dos oito episódios, realizados pelo bósnio Goran Kapetanović (que se estreia na televisão depois de algumas curtas e longas-metragens), mantém-se um exercício de suspense em crescendo enquanto também vai desenhando e contrastando o quotidiano das protagonistas - e as suas visões do mundo, que em alguns casos são radicalmente diferentes das que tinham no arranque da trama. Todos os actores, dos principais aos secundários, agarram as personagens com convicção, embora sobressaia o olhar tão triste como obstinado de Gizem Erdogan na pele de Pervin, um dos pilares emocionais deste retrato realista e envolvente.

4/5

Unorthodox.jpg

"UNORTHODOX" (minissérie): Mergulho nos costumes e dinâmica de uma comunidade judaica ortodoxa nova-iorquina a partir da experiência de uma adolescente que foge dela para Berlim, esta minissérie de quatro episódios é a nova (e elogiada) aposta da alemã Anna Winger, autora de "Alemanha 83" (exibida por cá na RTP2) e sequelas. Realizada pela conterrânea Maria Schrader ("Stefan Zweig: Adeus, Europa") e baseada na autobiografia de Deborah Feldman, oferece uma tour de force no feminino que se completa com a interpretação de Shira Haas no papel principal. Embora a actriz israelita já conte com alguns desempenhos no currículo, este é o que lhe tem dado maior visibilidade, inteiramente merecida pela forma como consegue captar a angústia, solidão e determinação de uma mulher que não se revê nos códigos familiares, sociais e religiosos do seu meio. Grande parte da carga dramática desta história de auto-descoberta deriva da sua entrega, e o retrato só não ganha mais força porque algumas figuras da sua comunidade ficam por explorar (mesmo que a câmara documente minuciosa e respeitosamente rituais e tradições) e a entrada num desejado mundo novo é feita com demasiadas conveniências de argumento (e através de um grupo de novos amigos europeus tão acolhedores como genéricos). Haas, no entanto, tem uma das melhores personagens e interpretações desta temporada televisiva, e mais do que justifica a viagem geográfica a espiritual (bem conduzida, apesar das limitações, pela showrunner e realizadora).

3/5

Partindo de uma bruta agonia para o sonho

Letrux_Prantos.jpg

O segundo álbum de LETRUX tem sido daqueles que parecem ganhar outra ressonância em tempos de confinamento, até porque funciona como ressaca depois da atmosfera quase sempre esfuziante da estreia, "Letrux em Noite de Climão" (2017).

Não que "Letrux aos Prantos" seja um disco amargurado, muito menos derrotista, mas o mergulho interior tão a fundo poderá surpreender quem esperasse um regresso de evolução na continuidade. O primeiro single, "Déjà Vu Frenesi" ainda mantinha algum apelo rítmico do registo antecessor, enquanto marcava lugar entre as grandes canções do ano. Já o segundo, "EU ESTOU AOS PRANTOS", será um tema mais representativo do ambiente do álbum, com texturas herdadas do psicadelismo e um estado de alma mais conturbado - mas não resignado, nem que o conforto seja o sonho.

O tom onírico e retro sai reforçado no videoclip, filmado na serra do Rio de Janeiro com recursos modestos, já em dias de isolamento social, através da colaboração da brasileira com alguns amigos - como Julio Parente, o realizador. Vale a pena partir com eles uns minutos: