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gonn1000

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Um aquecimento para festas de pijama (ou de quimono?)

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Com regresso aos discos marcado para 4 de Setembro, data da edição de "L’Ère du Verseau", os YELLE abriram caminho para o quarto álbum em tom de balada, através de "Je t'aime encore", mas é no segundo single de avanço que recuperam a sua faceta mais entusiasmante.

Dançável, acelerada e repetitiva, "KARATÉ" mostra a dupla francesa a apostar no contraste de ritmos e de jogos de palavras iniciado nos dias do registo de estreia, "Pop Up" (2007), e mantido em "Safari Disco Club" (2011), "Complètement fou" (2014) e no EP "BOPS" (2018). A arrancar com balanço house, a canção aproxima-se da synth-pop mais para o final sem perder o embalo e conta com sugestão de coregrafia no videoclip, protagonizado pelo bailarino Joris Wolfy Gangzi em modo karateca frenético. Aquecimento mais do que conseguido para um disco a juntar à lista de espera da rentrée:

A bordo de um thriller confinado

Joseph Gordon-Levitt é o copiloto da viagem de "7500", que convida o espectador para uma experiência tensa num avião ameaçado por terroristas. O arranque acaba por ser mais conseguido do que a aterragem, mas o actor e o realizador Patrick Vollrath não deixam de levar o filme a bom (aero)porto.

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"7500" é a antítese de blockbusters como "Non-Stop" (2014) e aventuras aéreas comparáveis onde Liam Neeson ou outro herói hollywoodesco salvam o dia, depois de tornarem o interior de um avião num campo de batalha. E a primeira longa-metragem do alemão Patrick Vollrath, até aqui realizador de várias curtas, nem precisa de ser uma pedrada no charco para se afastar desse modelo de thriller espalhafatoso, optando por um formato escorreito que alia sobriedade, nervo e inteligência, mesmo que o terceiro acto pudesse atingir outros voos (já lá vamos).

Uma das particularidades desta experiência a bordo é a de decorrer quase sempre na cabine do piloto, e durante boa parte da duração em tempo real, sem que essas limitações auto-impostas sejam um entrave. Pelo contrário, revelam um exemplo conseguido e engenhoso da máxima "menos é mais", numa aposta que lembra a lógica próxima da série-B dos também interessantes "Enterrado" (2010) ou "Locke" (2013), circunscritos ao espaço de um caixão e de um automóvel, respectivamente.

Partindo da decolagem de um A320, saído de Berlim rumo a Paris, "7500" resulta de uma aliança feliz entre um realizador com um sentido apurado de economia narrativa e um actor à altura da confiança que lhe é depositada.

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Assumindo o papel protagonista e estando presente na esmagadora maioria das cenas, Joseph Gordon-Levitt evita um exibicionismo eventualmente tentador e entrega-se a uma contenção decisiva para que esta viagem seja verosímil. É uma pena que não o tenhamos visto muito nos últimos anos, uma vez que se tem revelado um dos actores norte-americanos mais confiáveis da sua geração graças a desempenhos como o deste copiloto do qual o espectador facilmente se torna cúmplice (sem que o argumento force a nota).

Já Vollrath trata de garantir que o protagonista não tenha de carregar o filme às costas. Entre a utilização oportuna da câmara à mão, a assegurar um sentido de espaço invulgar numa primeira longa, ou a recusa de sublinhar este exercício de suspense com música, optando por um trabalho de som que reforça a sensação de confinamento com grande eficácia (ouçam-se as tentativas de arrombamento da porta da cabine), o realizador vai vincando sinais de personalidade que também passam pelo recurso à semi-improvisação ou pela forma como se serve uma televisão a preto e branco do cockpit como única janela para o interior do avião.

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Ao deixar a personagem de Gordon-Levitt tão descoordenada como o espectador quanto à situação dos passageiros e da tripulação, o argumento leva mais longe uma premissa mais inquietante do que surpreendente, ainda que bem aproveitada. Mas se é difícil não estar com protagonista empático, com tanto de vulnerável como de resiliente, também há que reconhecer que os antagonistas são o elemento menos conseguido de "7500". Quando não faltam críticas a estereótipos de muçulmanos em muita ficção, este é mais um caso a colocá-los na pele de terroristas, e sem mergulhar a fundo nas suas motivações.

É verdade que uma outra personagem ajuda a contrariar esse maniqueísmo ou que, mais para o final, Vollrath vai tentando mostrar mais dimensões de um dos sequestradores, embora esse esforço não se mostre tão convincente como o tom meticuloso da primeira metade do filme. Em todo o caso, quem não exigir uma viagem sempre em primeira classe não dará o tempo por perdido, sobretudo face a muita concorrência de low cost duvidosa. E não se podia pedir mais ao copiloto...

3/5

"7500" está disponível em streaming na Amazon Prime Video.