Dos Cool Hipnoise aos Sitiados, passando pelos Kussondulola ou Cais do Sodré Funk Connection, João CABRITA tem quase tantas colaborações no currículo como anos enquanto músico profissional, que já atingiram a marca das três décadas. Mas o saxofonista só aceitou o desafio da primeira aventura a solo há poucos meses, quando editou o álbum de estreia homónimo em Outubro (que traz como bónus outro disco, "Quarantine Sessions", gravado durante o período de confinamento).
Viagem entre o jazz e o funk, com acessos rock ou afrobeat, a aposta da Omichord Records é das melhores surpresas da música que se faz por cá nascida em 2020 , embora esteja longe de ser uma criação individual. Cúmplices como The Legendary Tigerman, Tó Trips ou Sandra Baptista são alguns dos convidados decisivos para um alinhamento no qual se ouvem também as colaborações de Sam The Kid, Hélio Morais ou Gui, entre outros nomes.
No novo single, no entanto, o protagonismo vai para as vozes de Tamin, Silk, Susana Félix e Selma Uamusse, que fazem de "NEVER GONNA GIVE IT UP" o único tema cantado do alinhamento e aquele que o encerra - além do episódio mais optimista de uma experiência que percorre vários estados de alma em modo instrumental.
A canção não só fecha o disco como é a banda sonora do último capítulo de uma história que tem sido contada nos videoclips dos singles anteriores - "Dancing With Bullets" (parte 1), "Afronaut's Lament" (parte 2) e "Caravan" (parte 3) -, escrita e realizada por Miguel Leão. Uma visão de Lisboa fora de horas, em tom film noir q.b., onde não falta uma proto-femme fatale (Érica Rodrigues) incansavelmente perseguida pelo protagonista (Fernando Nobre). E com um travo de ficção científica a insinuar-se entre memórias difusas e ameaças de gangsters locais:
Entre a antiguidade e a Segunda Guerra Mundial, em terra ou no mar, duas das boas séries do momento revisitam batalhas históricas - uma pode ver-se em streaming, outra é das melhores propostas televisivas.
"BARBARIANS" (T1), Netflix: A nova série alemã da plataforma de streaming é uma das suas apostas mais populares do ano e um bom convite ao binge-watching. Com apenas seis episódios, esta versão ficcionada do que levou a uma batalha histórica - a de Teutoburgo, que opôs tribos germânicas ao Império Romano no século IX a.C. - é uma saga de aventuras escorreita e empolgante, mesmo que não invente nada para quem está familiarizado com produções na linha de "The Last Kingdom" ou "Vikings" (com a qual partilha um dos realizadores, Steve Saint Leger). Ou ainda da também recente "Romulus", outro recuo à antiguidade em modo bélico.
Mas "Barbarians" até tem um trio de protagonistas mais carismático do que os dessa série da concorrente HBO Portugal: a guerreira germânica Thusnelda, o seu companheiro Folkwin, igualmente destemido (uma das personagens fictícias da trama), e Armínio, amigo de infância destes, criado pelos romanos e a figura mais ambivalente desta história (defendida por um dos desempenhos mais fortes, a cargo do austríaco Laurence Rupp).
Falada em alemão e em latim, esta criação de Andreas Heckmann, Arne Nolting e Jan Martin Scharf tem outras singularidades no esmero da direcção artística e guarda-roupa (sobretudo das comunidades tribais) e é abrilhantada pela direcção de fotografia de Christian Stangassinger (em especial nas cenas nocturnas iluminadas pelo fogo), opções estéticas que compensam alguns lugares comuns do argumento. E o último episódio confirma que os autores e realizadores têm estofo para moldar uma grande batalha, ainda que numa escala mais modesta do que as de marcos televisivos como "A Guerra dos Tronos". Venha então a segunda temporada, já confirmada.
3/5
"DAS BOOT" (T2), Sky One/AMC (e disponível na íntegra na aplicação do MEO): Apesar do título, a segunda temporada da série alemã inspirada no filme homónimo de Wolfgang Petersen não decorre só no alto-mar, sendo ainda mais expansiva do que a primeira. Desta vez, além do oceano Atlântico e de La Rochelle, localidade francesa ocupada pelo exército nazi, a acção estende-se até Nova Iorque e alarga o olhar à segregação de afro-americanos e à popularidade crescente do jazz.
Felizmente, a equipa de argumentistas não perde o norte e consegue equilibrar novos e velhos cenários e personagens, valorizando um elenco vasto e internacional e um retrato de grande fôlego narrativo. Embora se sinta falta da presença regular de Vicky Krieps, um dos pilares da primeira temporada que tem agora uma participação reduzida, Fleur Geffrier é uma substituição à altura na pele de Margot Bostal, personagem que passa de secundária a uma das principais e é um exemplo de garra e insubmissão enquanto rosto da resistência aliada francesa durante a Segunda Guerra Mundial.
Clemens Schick, outro dos novos protagonistas, ajuda a tornar Johannes von Reinhartz um capitão longe de estereótipos de caracterização nazis, o que aliás acontece com outras figuras desta disputa: de Klaus Hoffmann (Rick Okon), a questionar a sua lealdade durante a chegada aos EUA, ou até Hagen Forster (Tom Wlaschiha), com uma devoção cada vez menos cega aos ideais (e sobretudo aos métodos) da facção alemã. Mas a humanização das forças nazis tem limites: que o diga Stefan Konarske, sempre frio e calculista no papel de Ulrich Wrangel, oficial fidelíssimo a Hitler e outra presença forte de uma segunda temporada que duplica o número de embarcações no centro da acção (a nova fase deveria chamar-se "Os Submarinos") e também oferece mais e às vezes melhor do que a anterior noutros aspectos. Só faltou deixar claro se este relato acaba aqui ou se há mais capítulos a caminho...