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gonn1000

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

O MUNDO AO CONTRÁRIO

Centrado em questões polémicas e actuais, “O Pesadelo de Darwin” (Darwin’s Nightmare) é a visão do realizador austríaco Hubert Sauper sobre as consequências de uma experiência científica decorrida durante a década de sessenta, no Lago Victoria, na Tanzânia, onde foi inserida uma nova espécie de peixe, a perca do Nilo, que se alimentou das outras já existentes e provocou alterações consideráveis no ecossistema local.

No entanto, aquilo que por um lado foi um desastre ecológico, mostrou-se comercialmente rentável, pois a perca do Nilo disseminou-se rapidamente e foi alvo de grande procura externa, sendo exportada para os mercados europeu e japonês.
Embora este negócio seja lucrativo, não gerou uma melhoria das condições de vida da maioria da população circundante, entregue a recursos escassos e a perspectivas de vida limitadas, e é o reflexo desta mudança nos habitantes da área que “O Pesadelo de Darwin” explora, não poupando ataques ferozes ao lado mais dúbio da globalização.

Sauper tem aqui um tema rico e pertinente, mas o seu documentário nem sempre o trabalha de forma interessante. O realizador proporciona alguns bons retratos do dia-a-dia de pobreza dos pescadores e prostitutas (as profissões mais recorrentes e viáveis), assim como das inquietações das crianças de rua, captando alguns testemunhos impressionantes mas nunca seguindo a via fácil de um sensacionalismo estridente e manipulador (o resultado é assim mais subtil do que se fosse criado por um Michael Moore).
O problema é que “O Pesadelo de Darwin” nem sempre entrelaça os seus elementos de forma conseguida, contendo muitos momentos dispensáveis e repetitivos, gerando algum marasmo na narrativa.

É um projecto com intenções meritórias, na medida em que coloca questões acerca do conteúdo das cargas dos aviões que transportam, alegadamente, mantimentos para a Tanzânia, por exemplo, ou por contrastar comissários económicos, pilotos ou industriais com problemáticas incómodas e de difícil resposta.
Embora estes aspectos sejam interessantes, não têm um enquadramento formal à altura, já que Sauper tem escassas ideias de cinema e o seu estilo nunca se afasta de um modelo televisivo e indistinto, caindo na rotina.

Mesmo que “O Pesadelo de Darwin” seja um objecto cinematograficamente pobre, consegue oferecer algumas cenas marcantes, fruto da incisiva investigação do realizador, como as que focam a forma como a perca do Nilo é tratada e armazenada (e cujas condições de higiene, segundo o que Sauper mostra, são bastante diferentes das que um comissário europeu defende), as peripécias perturbantes protagonizadas pelos miúdos de rua (sobretudo o episódio em torno da lata de arroz) ou os comentários de um residente da área acerca da guerra.

Infelizmente, momentos destes são apenas pontuais, porque durante grande parte a sua duração “O Pesadelo de Darwin” fica aquém do documentário que poderia ter sido.
Presume-se, então, que as múltiplas distinções de que o filme tem sido alvo – nomeação para os Óscares, Prémio de Melhor Documentário nos Prémios Europeus de Cinema, assim como troféus nos festivais de Veneza, Paris ou Chicago – sejam principalmente devido à ideia-base, porque a concretização, essa, deixa a desejar, o que num caso destes é forte pena.
E O VEREDICTO É: 2/5 - RAZOÁVEL

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