Saltar para: Post [1], Comentar [2], Pesquisa e Arquivos [3]

gonn1000

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Amor em tempos de guerra

Adaptação do romance homónimo de Ian McEwan, "Expiação" (Atonement) chega às salas com um impressionante número de nomeações para vários prémios - incluindo sete para os Óscares e após ter ganho a dos Globos de Ouro para Melhor Drama -, reforçando o estatuto de estrela de Keira Knightley e impondo-se como um dos filmes britânicos mais falados dos últimos tempos.

 

Muitas vezes, estas obras de suposto prestígio embrulhadas em muita pompa e circunstância acabam por defraudar as expectativas ao não apresentaram mais do que um academismo tão requintado quanto insípido - foi o caso, por exemplo, de "A Paixão de Shakespeare", de John Madden -, mas felizmente "Expiação", mesmo estando longe de ser perfeita, mantém-se muito acima da banalidade.

 

 

O facto de estar acima da média não surpreende assim tanto, tendo em conta que é realizada por Joe Wright, cuja primeira longa-metragem, "Orgulho e Preconceito", tinha já sido uma refrescante adaptação do livro de Jane Austen. Aqui o realizador mantém os elementos que o tinham colocado entre as promessas do cinema britânico, fugindo aos mecanismos e tendências habituais em muitos filmes de época e aprimorando o seu talento para sequências de forte impacto visual (mas nunca ostensivo).

 

Ancorando-se num complexo novelo narrativo, "Expiação" oferece um olhar sobre a culpa e a redenção, partindo da relação de dois jovens, Robbie e Cecilia, que se conhecem desde a infância mas que só à entrada na idade adulta é que começam a aperceber-se do que sentem um pelo outro. Infelizmente, aí pode já ser tarde demais, uma vez que Robbie é acusado de um crime alegadamente testemunhado pela irmã mais nova de Cecilia, Briony, obrigando-o a passar os anos seguintes preso e, posteriormente, a integrar as tropas inglesas durante a Segunda Guerra Mundial.

 

 

Embora seja uma obra consistente, "Expiação" perde algum impacto por atingir um nível superlativo no primeiro terço mas raramente ser capaz de o igualar nos restantes, já que a narrativa perde alguma fluidez quando a acção se concentra nos episódios relacionados com o período da guerra - mas mesmo nestes é difícil não reconhecer momentos magníficos, como aquele em que a câmara se passeia durante vários minutos pela praia de Dunquerque num plano-sequência de antologia, oferecendo um vibrante retrato do dia-a-dia das tropas.

 

De um modo geral, contudo, o filme entusiasma mais nas cenas iniciais, e aí Wright é exímio na construção da atmosfera lânguida que envolve a mansão da família de Cecilia, o espaço onde decorrem alguns dos momentos-chave da acção como o da fonte ou o da biblioteca, ambos vincados por uma sufocante tensão emocional e sexual entre o par protagonista.

Quando abandona este cenário, "Expiação" torna-se numa história de amor vitimada pelos entraves da guerra, perdendo parte da sua singularidade e ganhando alguma palha narrativa, ainda que esta quase seja disfarçada pela estupenda fotografia de Seamus McGarvey, a não menos brilhante banda-sonora de Dario Marianelli (justamente premiada com um Globo de Ouro, até porque ideias como a do som da máquina de escrever integrado na música não surgem muitas vezes) ou a hábil e elegante realização de Joe Wright.

 

 

A contribuição do elenco é igualmente decisiva, e se a cada vez mais mediática Keira Knightley obtém aqui, de facto, um dos seus melhores desempenhos - que não chega a destronar, contudo, o de "Orgulho e Preconceito" -, convém não esquecer as de James McAvoy, um dos jovens actores ingleses a acompanhar, e de Saoirse Ronan, uma grande revelação na pele de Briony aos 13 anos, cujo olhar imperscrutável gera alguns dos planos mais magnéticos.

 

Não sendo ainda o grande filme que se pressente que Wright será capaz de fazer, "Expiação" é um passo em frente em relação à sua promissora primeira obra e reforça o interesse por uma filmografia que se arrisca a tornar-se ainda mais estimulante. Quem o for ver à espera do filme do ano devido ao aparato que o rodeia poderá sair desiludido, mas os que apenas procurarem uma consistente experiência cinematográfica têm aqui uma proposta muito recomendável.

 

 

 

Comentar:

Mais

Se preenchido, o e-mail é usado apenas para notificação de respostas.

Este blog tem comentários moderados.