Um filme fal(h)ado
E se Cristóvão Colombo tivesse sido português? É esta a ideia que Manoel de Oliveira tenta comprovar em "Cristóvão Colombo - O Enigma", em que parte de investigações que defendem que o navegador que descobriu a América não era italiano mas originário da aldeia de Cuba, no Alentejo.
Os protagonistas do filme são, por isso, Manuel Luciano da Silva e Sílvia Jorge da Silva, casal que na década de 40 realizou estudos com vários indícios de que a nacionalidade de Colombo era portuguesa. Oliveira começa por se concentrar nas pesquisas da dupla, nos tempos em que eram mais jovens, e acaba com o foco na sua relação nos dias de hoje, já na velhice, debruçando-se sobre a sua experiência conjugal.
Infelizmente, "Cristóvão Colombo - O Enigma" nunca se revela muito interessante em nenhum dos cenários, sendo até bastante insípido durante grande parte da sua duração. A História de Portugal é abordada com num misto de didactismo gritante e uma nostalgia excessivamente reverente pelas glórias dos Descobrimentos, através de diálogos demasiado explicativos e sem qualquer traço de espontaneidade.
As interpretações não disfarçam essa falta de subtileza, já que tanto Ricardo Trêpa como Leonor Baldaque não concedem qualquer espessura dramática às personagens, mantendo sempre uma rigidez exasperante e debitando texto sem convicção.
Ao fim de poucos minutos, o filme vai caindo num esquematismo incapaz de seduzir, e nem mesmo a sobriedade da câmara de Oliveira é capaz de compensar a mediocridade de tudo o resto, até porque a iluminação do interior dos locais por onde o casal vai passando deixa muito a desejar.
Admita-se que o cineasta gera, pontualmente, alguns pequenos milagres, como a criação de uma Nova Iorque dos anos 40 envolta em nevoeiro ou o modo como a retrata hoje em dia, a milhas da forma como esta costuma ser filmada.
Mas por cada oportuna ideia visual há duas ou três fragilidades do argumento ou das interpretações, o que leva a momentos dispensáveis como as aparições do anjo de Portugal ou a declamação de um poema de Pessoa por Luís Miguel Cintra, um dos maiores picos de pretensão do filme.
Quando a acção foca o casal na velhice torna-se um pouco mais entusiasmante, até porque a reflexão sobre a experiência conjugal se sobrepõe, e ainda bem, à vertente histórica. Aqui, o par protagonista surge interpretado por Oliveira e a sua esposa, o que talvez ajude a explicar o intimismo e cumplicidade que resulta de algumas cenas, contrapondo-se à postura forçada de Trêpa e Baldaque.
Quando, nestes momentos, "Cristóvão Colombo - O Enigma" se debruça na relação amorosa - que parece não ser tanto a das personagens mas a daqueles que as interpretam - até oferece algumas sequências curiosas e enternecedoras, embora deite tudo a perder quando se entrecruza com a História e volte aos tiques de vídeo institucional amador. E são esses que, por serem quase omnipresentes, tornam o filme numa experiência cinematográfica pesada e mortiça, que apesar de não ir além dos 70 minutos parece durar o dobro do tempo, resultando num enigma que não desperta muita curiosidade.