Irmão, onde estás?
Embora Nanni Moretti seja o único realizador italiano do momento cujas obras vão chegando regularmente ao circuito de estreias nacionais, há outros das mesmas origens que, mesmo com menor mediatismo, não são menos interessantes - antes pelo contrário.
A julgar por "O Meu Irmão é Filho Único" (Mio Fratello è Figlio Unico), Daniele Luchetti parece ser um desses casos, uma vez que a sua obra mais recente é um drama familiar com fortes contornos políticos que traduz um complexo olhar sobre o contexto italiano das décadas de 60 e 70 enquanto apresenta também um consistente estudo de personagens.
Alicerçado na relação conturbada de dois irmãos, o filme segue o percurso de ambos ainda que se debruce mais sobre o do mais novo, Accio, cuja desistência do seminário na adolescência reforça a sua problemática situação familiar, já que os pais, ambos operários, depositavam nessa via a solução para um futuro mais próspero.
O isolamento daí resultante leva-o a travar uma forte amizade com um vendedor que acaba por influenciá-lo a aderir a ideais fascistas, escolha que acentua o relacionamento conflituoso com o seu irmão, Manrico, comunista acérrimo considerado um líder nato por muitos.
À medida que entram na idade adulta, ambos defendem com maior convicção as suas ideologias ainda que, entre as recorrentes crispações, nunca destruam a cumplicidade que sempre os uniu, que volta a ser ameaçada quando Accio se apaixona pela namorada do irmão, Francesca.
Fazendo bem a ponte entre o cómico e o dramático e concedendo mais espaço às características e motivações do protagonista do que a quaisquer imposições políticas - o filme nunca favorece qualquer dos extremos -, "O Meu Irmão é Filho Único" desenvolve-se com perspicácia e sensibilidade mas não chega a ser a grande obra que se insinua nas primeiras cenas.
O problema é principalmente do argumento, que mesmo sendo coeso - o mínimo que se esperaria de Sandro Petraglia e Stefano Rulli, que assinaram o de "A Melhor Juventude", de Marco Tullio Giordana - poderia ir mais longe, em particular se desse mais tempo de antena a Manrico e Francesca.
Sendo personagens intrigantes, nunca chegam a ser tão aprofundadas como mereciam, embora também não comprometam que esta seja uma boa surpresa já que, em compensação, Accio garante que a carga emocional não fique comprometida.
Grande parte deste mérito é da interpretação de Elio Germano, nada abaixo do excelente, capaz de interligar vulnerabilidade, obstinação e desencanto e tornando-o num dos actores mais promissores do cinema europeu.
De resto, todo o elenco é irrepreensível, de onde se destacam também Riccardo Scamarcio e Diane Fleri, os outros vértices do jovem triângulo amoroso.
Não arrebatando nem mesmo inovando muito, "O Meu Irmão é Filho Único" é, ainda assim, quase sempre absorvente, oferecendo uma história bem escrita, filmada e superiormente interpretada, e essa assinalável solidez é mais do que suficiente para que este regresso ao passado com fortes ecos no presente seja não necessariamente uma prioridade, mas pelo menos um filme a ver.