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gonn1000

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Festa dos anos 80

Os Black Kids são o caso típico de uma banda que dificilmente conseguiria fazer-se notar, pelo menos de forma imediata, se não tivesse na Internet um forte canal de divulgação - para o melhor e para o pior.

 

O seu primeiro EP, "Wizard of Ahhhs" (2007), saiu rapidamente de Jacksonville, na Florida, cidade-natal do jovem quinteto, em direcção a inúmeros blogues e revistas online, que acolheram de forma quase consensual as quatro canções aí incluídas (e disponibilizadas gratuitamente no site do grupo).

Não faltou quem encontrasse na banda uma das melhores revelações do ano - ou mesmo da década -, e o súbito hype deixou expectativas elevadas para o álbum de estreia.

 

 

"Partie Traumatic" surge um ano depois, mas muitos dos que então mais se entusiasmaram com a banda são os mesmos que agora não a poupam às críticas menos misericordiosas, e embora o disco não deixe de ter adeptos também não tem tido tido a repercussão tão auspiciosa que muitos antecipavam.

 

Felizmente, pelo menos para quem não depositava no grupo expectativas tão altas - e exageradas -, o álbum é ainda uma das boas surpresas de 2008, estando longe de gerar qualquer revolução - que de resto nem pretende - mas funcionando bem enquanto descomprometido conjunto de canções indie pop dançáveis.

 

Como o título sugere, "Partie Traumatic" alia atmosferas festivas a alguma melancolia em retratos de uma juventude vincada pelo hedonismo e solidão, gerando canções centradas em one night stands ("Hit the Heartbreaks"), suspeitas de infidelidade ("Love Me Already") ou flirts discretos ("I'm Making Eyes at You"), situações que o quinteto aborda com uma ironia por vezes oportuna.

 

 

Tal como muitas novas bandas desta década, os Black Kids não têm problemas em recolher muitas influências do caldeirão musical dos anos 80, estejam estas mais ou menos legitimadas, como já tinham deixado evidente no single "I'm Not Gonna Teach Your Boyfriend How to Dance With You", tema que os atirou para uma relativa popularidade.

 

Talvez por esse ter sido bem sucedido é que o grupo mantém atmosferas semelhantes nas restantes canções do disco, polvilhando-as com guitarras féericas, sintetizadores a roçar - ou ultrapassar - os limites do kitsch, teclados de tons épicos e coros femininos que se entrecruzam com o vocalista Reggie Youngblood.

O resultado soa ao de uma festa organizada pelos Cure e Go! Team para a qual foram convidados os Killers, Arcade Fire, Bravery ou B-52's, não necessariamente por esta ordem.

 

Derivativo mas frequentemente contagiante, "Partie Traumatic" nem sempre aproveita as suas influências da melhor forma, cujo exemplo mais gritante será a excessiva colagem de Youngblood ao registo e maneirismos vocais de Robert Smith, sobretudo nos momentos de um dramatismo postiço.

 

 

Bem mais convincentes são as vozes de Ali Youngblood e Dawn Watley, capazes de injectar energia a alguns refrões e salvar canções que ameaçam afogar-se na banalidade - caso das melodias herdadas dos girl groups dos anos 60 no final de "I've Underestimated My Charms (Again)" ou do irresistível embalo disco que interrompe "Love Me Already".

 

A produção de Bernard Butler (ex-guitarrista dos Suede e produtor de Duffy ou Aimee Mann) torna as canções mais polidas do que as versões que a banda apresentou no EP, e se isso nem sempre joga a seu favor também não impede que se registem alguns momentos inspirados - seja a excitação nervosa do tema-título, o comparável sentido de urgência da flamejante "Listen To Your Body Tonight", a aproximação ao funk de "I Wanna Be Your Limosine" ou o discreto e bonito refrão de "I'm Making Eyes at You".

 

Poderá saber a pouco para quem esperasse encontrar em "Partie Traumatic" um dos grandes discos do ano, mas revela-se bastante satisfatório se não se procurar mais do que canções dançáveis, orelhudas e consistentes q.b., nascidas de um interessante cruzamento dominado pelo power pop e new wave.

Chega para ter aqui uma banda a acompanhar, de preferência sem esperar dela a genialidade que não tem obrigação de atingir.

 

 

 

Black Kids - "I'm Not Gonna Teach Your Boyfriend How to Dance With You"