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gonn1000

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Folk sombria para as noites de Inverno

Diz-se influenciada pela música de PJ Harvey, Kate Bush ou Edith Piaf, assim como pela escrita de Sylvia Plath ou Emily Jane Brontë, e embora seu disco de estreia, "Dark Undercoat", revele de facto marcas de algumas destas referências, surpreende pela forma como desenha já um imaginário tão singular e idiossincrático.

 

Originária de Santa Cruz mas residente em São Franscisco, Emily Jane White é mais um nome a acrescentar ao estimável núcleo de cantautoras que tem tido particular visibilidade nos últimos anos, e embora não tenha despertado atenções como Feist ou Cat Power, este seu primeiro álbum demonstra que não será por falta de talento.

 

 

Editado em 2007, "Dark Undercoat" só recentemente teve distribuição internacional e prova que mais vale tarde do que nunca, já que é um dos mais absorventes discos de estreia em muitos meses.

 

Mas apesar da sua autora só agora apostar num percurso em nome próprio, a consistência aqui evidente estará relacionada com o facto de ter integrado várias bandas desde e adolescência, de projectos metal e punk a outros diametralmente opostos, mais centrados na folk, como foi o caso dos Diamond Star Halos.

É destes últimos que o seu álbum mais se aproxima, convocando ainda traços do blues e da country para moldar o cenário das suas histórias.

 

 

 

Ao longo de dez canções, tanto mergulha em relatos de amores desolados sobre homens rudes e circunspectos e cantoras taciturnas como em ensaios de recolhimento na solidão e consequentes abismos emocionais (como quando canta "Everybody's got a little hole in the middle / Everybody does a little dance with the devil", na soturna mas melódica "Hole in the Middle").

 

Inserindo nas suas histórias heranças da religião e ambientes próximos dos de alguma literatura gótica, Emily Jane White proporciona aqui um intrigante conjunto de canções, cuja aura sombria, por vezes mesmo críptica, sai reforçada pelo minimalismo instrumental - geralmente conta apenas como companhia o piano e guitarra acústica, aos quais se juntam o baixo e o violoncelo em dois ou três momentos.

 

 

A sua voz segura, quente e expressiva e a predilecção por um registo melancólico têm suscitado comparações a Cat Power, ainda que as suas canções sejam mais atmosféricas e esparsas e lembrem a crueza de Scout Niblett (confira-se em "Dagger"), a fantasmagoria de Bat for Lashes, o desencanto de Alina Simone e, por vezes, a sensibilidade de Suzanne Vega.

 

Mas como as comparações podem ser redutoras, nada como dedicar algumas audições a "Dark Undercoat" e ir (re)descobrindo estimáveis episódios intimistas como a arrepiante faixa-homónima, o breve estilhaço de esperança registado em "Time on Our Side" ou a solenidade de "Wild Tigers I Have Known" - tema também presente no aplaudido filme independente de Cam Archer com o mesmo título (realizador responsável pelos videoclips da cantora).

Bela estreia e uma das mais apropriadas para os serões nocturnos deste Inverno.

 

 

 

 

Emily Jane White - "Wild Tigers I Have Known"