Há vida depois da britpop
Longe vão os tempos das disputas com os Blur em plena euforia britpop ou de outras polémicas recorrentes. Distantes do auge registado dos anos 90, os Oasis não deixaram contudo de manter interessada uma considerável multidão heterogénea durante cerca de hora e meia, na noite de ontem no Pavilhão Atlântico, em Lisboa.
Deram início ao espectáculo às 21 horas, como previsto - a comprovar que a pontualidade britânica aplica-se de facto a alguns casos -, mas antes disso já os gritos e aplausos ecoavam pelo recinto do Pavilhão Atlântico, em particular na forte concentração de público junto do palco - a contrastar com o que se via nas bancadas, muito menos concorridas.
A efervescente mistura de beats e riffs em crescendo de "Fuckin' In The Bushes" serviu, como já é habitual, de introdução para a noite, e depois dessa curta descarga de electricidade a banda arrancou com "Rock'n'Roll Star", dando o mote para o que seguiria - "Tonight I'm a rock 'n' roll star", cantou Liam Gallagher no refrão, e a reacção que despertou em grande parte dos espectadores confirmou que, mesmo que o seu impacto já não seja o de meados da década de 90, os Oasis ainda impõem respeito no que toca a animar multidões.
O concerto foi, de resto, de um profissionalismo sem grandes reparos, e cumpriu aquilo que se esperaria de uma eficaz banda de estádio - ou neste caso, de pavilhão.
Se por um lado muitos dos presentes já estariam convencidos à partida, até porque o entusiasmo não teve grandes variações ao longo da actuação, ainda assim é louvável o facto do grupo terem optado por um alinhamento em modo best of.
Ao longo de sete álbuns de originais, não faltam aos Oasis canções que, goste-se ou não (e não há assim tantas bandas que dividam opiniões de forma tão vincada) marcaram várias gerações, como aliás foi visível num público heterogéneo, daqueles capazes de agregar pais, filhos e alguns avós.
É certo que os seus temas mais emblemáticos estão quase todos nos três primeiros discos, e embora alguns deles tenham tido o devido protagonismo no concerto, o alinhamento debruçou-se em material mais recente, em especial no último álbum, "Dig Out Your Soul", editado em 2008.
Considerado por muitos o melhor trabalho da banda em anos, está longe dos hinos britpop aos quais os Oasis são habitualmente associados, apostando antes num rock denso e atmosférico, com resquícios de algum psicadelismo e shoegaze, a milhas do tom imediato dos clássicos do grupo.
Momentos acelerados e ruidosos q.b. como "Falling Down", "Waiting for the Rapture", "To Be Where There's Life" ou "Ain't Got Nothin'" constaram entre os melhores da noite e demonstraram que, mesmo com um percurso vincado por altos e baixos, esta ainda é uma banda relevante.
Infelizmente, essa irregularidade que marca a carreira também dominou o concerto, não pelos arrufos dos manos Gallagher, que parecem pertencer mesmo ao passado, mas por algumas canções que não conseguiram manter a energia e ousadia das mais recentes, oferecendo alguns episódios mais insossos.
Foi o caso da versão acústica de "Don't Look Back In Anger", um dos momentos mais previsíveis do alinhamento, ainda que outros que também o foram tenham resultado bem melhor - as igualmente incontornáveis "Wonderwall", "Supersonic" e "Morning Glory", convites à nostalgia que registaram picos de intensidade antes do encore.
Este fechou com "I Am the Walrus", dos Beatles, numa versão a culminar com um final de absorvente distorção apoteótica que não destoaria em "Dig Out Your Soul".
Outras canções a reter incluiram a simplicidade de "Songbird" ou "The Importance of Being Idle", cantadas por Liam e Noel, respectivamente, e para a posteridade ficou ainda um dos poucos comentários deste último, onde pediu que José Mourinho regressasse a Inglaterra para treinar o Manchester City.
A complementar a competência da banda, quatro grandes ecrãs verticais garantiram que todos os espectadores pudessem observar os movimentos dos seis elementos em palco, entrecruzando as imagens destes com animações que mudaram de canção para canção.
Esta convincente vertente visual, aliada a um alinhamento suficientemente interessante e a uma banda coesa, poderia ter originado um concerto com maior fôlego, mas que acabou por não ir muito além da hora e meia de duração.
E se não terá sido particularmente inesquecível, pelo menos não ao ponto de justificar ocasionais acessos de narcisismo dos manos Gallagher - "Do you love me?", perguntou Noel a meio da actuação -, também não deixou de apresentar uma banda que satisfez as expectativas.
A britpop pode ter morrido, mas com concertos assim ainda parecer haver vida para os Oasis.
Fotos: Vera Moutinho
Oasis - "Wonderwall"