Sound & vision
As ideias são boas, mas não só não são novas como não foram aproveitadas de forma tão estimulante como o nome dos envolvidos sugeria. Foi esta a impressão que a colaboração entre os Micro Audio Waves e o coreógrafo Rui Horta, "Zoetrope", deixou na passagem do espectáculo pela Culturgest, em Lisboa, na quinta-feira passada.
Não se assumindo como um concerto, uma peça teatral ou uma instalação vídeo, este é um híbrido que funde traços de tudo isso, onde as canções da banda se conjugam com as imagens projectadas nas três telas atrás do palco (algumas gravadas no momento).
Entre estas surgem vários interlúdios com divagações dos elementos do grupo (principalmente da vocalista, Cláudia Efe), que reforçam a atmosfera densa e algo onírica do espectáculo.
A infância, a linguagem, o sonho, o movimento ou o medo são apenas algumas das temáticas que esta viagem propõe, de onde emana um intimismo que se pretende de apelo universal - não por acaso, algumas das sequências de animação tanto focam um quarto escuro como aglomerações de estrelas.
Esta simbologia nem sempre é muito subtil, embora não seja por isso que "Zoetrope" fique um pouco aquém do que poderia esperar.
Por um lado, a sua vertente multimédia não traz nada assim tão arrojado - o facto da banda se fotografar ou filmar em palco (ou ao público) é pouco mais do que um pormenor curioso e a maioria das restantes imagens que passam pelas telas também não são muito impressionantes.
Por outro, as novas canções dos Micro Audio Waves convencem mas não atingem, pelo menos ao primeiro embate, o nível das melhores de "Odd Size Baggage" - a excepção é "Sunshine Sunlight", magnífica criação pop que está no centro de um dos raros episódios (literalmente) reluzentes do espectáculo.
E embora conte com um ou dois momentos mais abrasivos, "Zoetrope" perde por não ter temas tão viscerais como "2night (U&I)" ou "Odd Size Baggage", que em concertos anteriores atiravam as actuações da banda para domínios de um musculado - e arrebatador - rock electrónico (do qual o grupo revelou querer afastar-se).
Aqui os ambientes são tendencialmente mais contemplativos e distantes, o que está muito longe de ser mau mas não esmaga a memória desse passado recente.
Quem se supera, contudo, é Cláudia Efe, que além da óptima e expressiva voz cativa pelas suas capacidades de performer, demonstrando uma carga teatral já presente em disco e alguns concertos e que tem agora oportunidade para se soltar.
É sobretudo pela sua presença que "Zoetrope" oferece alguns momentos hipnóticos, uma vez que a vocalista assumir a função de protagonista e a sua alternância de personas (com direito a trocas de indumentária entre o sombrio e o inocente) é interessante.
Pena que nem tudo o resto esteja à altura, tornando "Zoetrope" numa experiência que até pela duração (pouco mais de uma hora) acaba por saber a pouco - o que não o impede de ser um espectáculo com um rigor e sensibilidade estimáveis, sempre alicerçado em boas canções que merecem ser partilhadas com os seus autores num dos vários locais da digressão.
Excertos de "Zoetrope"