Uma noite (pouco) electrónica com os Franz Ferdinand
Das muitas bandas que revisitaram o pós-punk durante esta década, os Franz Ferdinand terão sido a que teve uma estreia mais auspiciosa, com um álbum homónimo que nem parecia um início mais um best of.
Após esse primeiro passo fulgurante, em 2004, onde cada canção tinham perfil de single irresistível, regressaram com "You Could Have It So Much Better", logo no ano seguinte, e o pouco tempo de intervalo ajudou a compreender as escassas mudanças no som do quarteto.
O menor entusiasmo com que esse segundo álbum foi acolhido talvez explique o facto do grupo ter demorado quatro anos até à edição de "Tonight: Franz Ferdinand", o muito aguardado terceiro disco, para muitos encarado como o tira-teimas em relação à relevância da banda.
A demora prendeu-se com a conturbada escolha dos produtores, que teve em Erol Alkan (que trabalhou com os Long Blondes ou Late of the Pier) e na equipa Xenomania (habitualmente associada às Girls Aloud) colaborações que se revelaram infrutíferas.
Dan Carey, cujos créditos incluem Kylie Minogue, Sia ou Lily Allen, acabou por ser a opção final, mas mesmo que a influência do produtor possa estar na origem de algumas (escassas) surpresas, grande parte de "Tonight: Franz Ferdinand" revela um grupo que se mantém igual a si próprio.
O que por um lado é bom, já que o álbum volta a apresentar uma apurada sensibilidade pop que resultou nos anteriores, devidamente integrada em canções cuja origem é facilmente identificável, mas que demonstra também que os Franz Ferdinand não conseguiram efectuar grandes mudanças na sua sonoridade - e esta era uma das metas que o disco pretendia atingir, de acordo com vários comentários do vocalista Alex Kapranos.
Algumas canções tinham sido já apresentadas em concertos dos últimos meses - como nos do Rock in Rio Madrid ou do Festival do Sudoeste - e notaram-se de facto contrastes face às mais antigas, sobretudo pela presença regular de sintetizadores.
E se é verdade que esse reforço da electrónica também se manifesta no disco, não surge de forma tão vincada como se esperaria e, mais do que isso, raramente é um ingrediente dominante na estrutura das canções, funcionando antes como adorno das guitarras.
A única excepção a esta regra gera o episódio mais inesperado, "Lucid Dreams", que no início não foge muito de território reconhecível dos Franz Ferdinand mas, em vez de terminar ao fim de cerca de três minutos, alarga-se para além dos sete e entra num viciante devaneio instrumental.
Exercício de electrónica pulsante, é quase como se uma remistura sombria dos Soulwax se intrometesse no meio do alinhamento e desse a "Tonight: Franz Ferdinand" a carga de risco e novidade que falta a quase todos os outros temas.
Há mais algumas louváveis tentativas de mudança, casos do tempero afrofunk de "Send Him Away", da sintética "Twilight Omens" ou do final tranquilo servido por "Dream Again" e "Katherine Kiss Me".
Já momentos de descarga como "Turn It On", "Bite Hard" ou "No You Girls" (variação algo acomodada de "Take Me Out") não destoariam nos álbuns anteriores e dificilmente tornam este num registo de ruptura - embora talvez ainda seja um disco de transição.
Não é que a banda chegue a desiludir, até porque "Tonight: Franz Ferdinand" nunca deixa de ser agradável.
O problema é que, por muito lúdicas e dançáveis que estas canções sejam, ficam sempre à sombra das do registo de estreia e não são mais inspiradas do que as de alguma concorrência - "Off With Their Heads", o mais recente dos Kaiser Chiefs, chega a ganhar na comparação, o que denuncia que os Franz Ferdinand estão mais perto da mediania do que do brilhantismo.
E se isto não chega a ser motivo para deixar de os seguir, uma vez que ainda são uma digna fábrica de refrães orgulhosamente pop, talvez obrigue a não lhes depositar tantas expectativas num próximo disco.
Franz Ferdinand - "No You Girls"