Universo particular
Prestes a completar trinta anos de carreira, os Depeche Mode podem já não manter o papel pioneiro que distinguiu alguns dos seus discos mas têm exibido ainda uma vitalidade invejável, sem grandes paralelos em nomes veteranos.
Provavelmente não voltarão a criar álbuns tão marcantes como "Music for the Masses" (1987) ou "Violator" (1990), já que não fazem um grande disco desde "Ultra" (1997), embora os registos mais recentes nunca tenham envergonhado um passado meritório como poucos.
Em vez de o recordar com mais uma compilação de hits, raridades ou gravações ao vivo (em muitos casos mais oportunistas do que oportunos), o trio de Dave Gahan, Martin Gore e Andrew Fletcher prefere seguir em frente.
E "Sounds of the Universe", o seu 12º álbum de originais, é mais um passo seguro mesmo que, tal como os dois anteriores, não traga grandes mudanças.
Mas isso nem é muito importante quando volta a apresentar o mínimo que se pede a um álbum: um conjunto de boas canções. O que de negativo há a apontar aqui nem é, aliás, essa ausência de tentativas de ruptura - que ainda assim poderiam ser bem-vindas -, antes o facto das canções raramente serem mais do que "apenas" boas.
Se no registo antecessor, "Playing the Angel" (2005), a banda de Basildon ofereceu dois ou três momentos de excepção, capazes de ombrear com alguns dos seus clássicos, "Sounds of the Universe" deixa as ambições todas no título megalómano.
Com ambientes menos contrastantes do que os últimos discos, investe em atmosferas tendencialmente contemplativas, e mesmo os momentos de maior dinamismo rítmico ficam longe da intensidade de outros tempos - a que não é alheia uma opção dominante pela electrónica face a um uso mais moderado das guitarras.
Nas letras, contudo, as temáticas continuam menos serenas, uma vez que a escrita de Gore (e a de Gahan, que assina três temas) mergulha mais uma vez em relações amorosas conturbadas, divididas entre jogos de desejo, ilusão, obsessão ou poder.
A excepção é "Peace", um dos episódios mais refrescantes do alinhamento, com uma luminosidade que marca tanto a melodia como a letra, exemplo de um optimismo atípico nos Depeche Mode ("I'm leaving bitterness /Behind this time/ I'm cleaning out my mind", "I'm leaving anger in the past/ With all the shadows/ That it cast").
No extremo oposto, "Wrong" é um single negro e abrasivo, de impacto imediato embora resista a múltiplas audições, e é pena que poucos momentos do disco estejam à sua altura.
Já "Fragile Tension" ou "In Sympathy" mostram que a banda não vai deixando de actualizar o design sonoro, com texturas que não andam muito longe da vertente mais planante de alguns projectos de electrónica recentes, como Gui Boratto ou os Telefon Tel Aviv.
"Jezebel" desenvolve a faceta crooner de Martin Gore (já exposta, por exemplo, em "Breathe", de "Exciter") e em "Come Back" ou "Miles Aways/The Truth Is" Gahan recupera os traços blues/gospel que dominaram o som do grupo em inícios da década de 90.
Ainda que estes temas apontem em direcções distintas, como um todo "Sounds of the Universe" não deixa de ser um dos álbuns mais homogéneos dos Depeche Mode, tanto a nível sonoro como qualitativo.
Não está, por isso, entre os seus melhores, nem sequer deverá ter o apelo (quase) universal de outros tempos, mas quem nunca deixou de ser seduzido pelo grupo dificilmente encontra aqui motivos que obriguem a mudar de ideias.
Depeche Mode - "Come Back (Live at 'Later With Jools Holland')