Canções para agarrarmos o coração enquanto caímos
"Holding my heart while falling", canta Karin Dreijer em "Carbon Dioxide", um dos pontos altos do seu terceiro e novo álbum enquanto FEVER RAY. É talvez o momento que melhor sintetiza a mistura de radicalismo e romantismo de um disco apropriadamente intitulado "RADICAL ROMANTICS", reflexão em torno da procura do amor que conjuga vulnerabilidade e uma estranheza que esta voz já carrega desde os tempos dos The Knife.
A outra metade da dupla sueca, o seu irmão Olof, é, aliás, um dos colaboradores do sucessor do melancólico longa-duração homónimo (2009) e do agreste "Plunge" (2017). Talvez por isso um single como "Kandy", acesso de languidez tropical na linha do clássico "Pass This On", soe mais a um passo ao lado dos The Knife do que a uma novidade de FEVER RAY, embora essa aproximação não seja tão evidente noutros temas às primeiras audições do disco.
Apesar de não dispensar uma excentricidade às vezes grotesca, que também vinca a imagem (da capa do álbum aos videoclips), "RADICAL ROMANTICS" acaba por ser menos radical do que o antecessor e também mais acessível do que a estreia. Não é exactamente um disco polido: das texturas vocais processadas (com apoteose no final de "Shiver") aos ritmos híbridos, com percussão e furor industrial, estas canções mantêm intacto o ADN de quem as assina. Mas também parece haver uma maior atenção à composição do que em "Plunge" e um aprumo melódico rumo a uma pop electrónica mais digerível ao primeiro impacto.
Além de Olof Dreijer em quatro faixas, a lista de convidados inclui a portuguesa Nídia, a transitar do álbum anterior, ou Trent Reznor e Atticus Ross, dupla responsável por um dos episódios mais incisivos: "Even It Out", que mais do que os Nine Inch Nails remete para o caminho (enfurecido) que os também regressados Yeah Yeah Yeah poderiam ter seguido (mas talvez nem eles se atrevessem a sugerir este cenário de vingança parental, ainda que temperado com um sentido de humor seco, depois do caso de bullying descrito na letra).
Outro tema para ouvir com o coração na mão, "What They Call Us" abre o alinhamento com uma ansiedade que não será alheia ao facto de Karin Dreijer se ter assumido artista queer na altura da edição de "Plunge". Alerta em tempo de totalitarismos e intolerância, contrasta com a serenidade glacial de "North", cuja moldura sonora criada por Reznor e Ross sugere ecos da famigerada "Running Up That Hill", de Kate Bush.
Mas a contribuição mais preciosa talvez seja a do britânico Vessel na já referida "Carbon Dioxide": prodígio de produção a elevar uma das composições mais inventivas, é um frenesim de urgência, arrojo vocal, sintetizadores e cordas ao nível do melhor de FEVER RAY e dos próprios The Knife. Aguenta, coração...