Do Chile à Chechénia, com liberdade e diversidade
De 18 a 26 de Setembro, o QUEER LISBOA está de volta ao Cinema São Jorge e à Cinemateca Portuguesa para uma 24.ª edição que não dispensa o formato presencial. E traz mais de 100 filmes LGBTQI+ para celebrar a ideia de comunidade, o corpo e a diversidade.
O uso de máscara é obrigatório, a lotação está mais limitada, os lugares desta vez são marcados, mas a programação promete ser tão livre como em anos anteriores do Festival Internacional de Cinema Queer.
Além de um conjunto de temas-chave que dão o mote - Cruising, Sex, Bodies, Play, Skin e Memory -, há, como sempre, propostas de longas e curtas-metragens, documentários e formatos mais experimentais (na secção Queer Art). E esta edição arranca logo de forma promissora com "Los Fuertes", drama do chileno Omar Zúñiga baseado na curta "San Cristóbal", que deixou boas memórias no Queer Lisboa há uns anos.
O encerramento fica por conta de "Petite Fille", documentário do francês Sébastien Lifshitz (autor do marcante "Quase Nada", de 2000), e uma das novidades desta edição é o debate sobre a Sida a partir da curta "Thrive" e de uma reportagem sobre o VIH em Lisboa - a entrada para o evento da Lisboa Sem Sida – Fast-Track City e do CheckpointLX é de entrada livre, mediante levantamento prévio de bilhete.
Também assegurado está o sexto Queer Porto, de 13 a 17 de Outubro, no Rivoli. Mas por agora, o foco vira-se para a programação lisboeta, com a sugestão de cinco filmes a espreitar nos próximos dias (e a promessa de mais algumas ao longo do festival):
"EL CAZADOR", de Marco Berger: O autor de "Taekwondo" ou "Ausente" é um dos habitués da programação do Queer Lisboa desde a sua primeira longa-metragem, "Plan B", de 2009. Este ano, o festival apresenta aquele que é já o oitavo filme do argentino (não contando com os dois volumes de "Tensión sexual", compilações de curtas filmadas a quatro mãos com Marcelo Briem Stamm) e também um dos mais arriscados. As vicissitudes do desejo, no masculino e pelo masculino, voltam a ser o ponto de partida para um drama que acompanha o processo de descoberta sexual de um adolescente de 15 anos. Mas a história coming of age ganha contornos mais turvos quando o protagonista é chantageado e obrigado a integrar uma rede de pornografia infantil...
"MAKE UP", de Claire Oakley: Esta primeira longa-metragem tem somado alguns elogios pela combinação intrigante de géneros, partindo de uma traição conjugal para desenhar um salto entre o realismo e ambientes oníricos, o drama iniciático e o fantástico a caminho do terror. Depois ter assinado várias curtas-metragens, a realizadora britânica segue aqui o quotidiano de uma adolescente que se muda com o namorado para um parque de férias isolado, mas acaba por se envolver com outra rapariga. E essa não deverá ser a única reviravolta de um filme que promete ir reforçando o suspense e o desconforto...
"TOUTES LES VIES DE KOJIN", de Diako Yazdani: Relato na primeira pessoa, este documentário baseia-se nas experiências do próprio realizador, um curdo iraniano refugiado político em França. Após ter realizado curtas-metragens sob a orientação do conterrâneo Abbas Kiarostami, Yazdani aventurou-se na primeira longa com esta partilha de uma viagem ao Iraque, ao lado de um amigo, onde confrontou familiares com os seus preconceitos em relação à homossexualidade - e ainda são alguns, ao ponto de nem existir um termo no seu idioma para designar um homossexual. Só que em vez de expressar um grito de revolta, o resultado tem sido mais destacado pela forma calorosa e bem humorada como retrata a diferença, sem deixar de apelar ao entendimento.
"VENTO SECO", de Daniel Nolasco: De "Indianara" a "Corpo Elétrico", passando por "Azougue Nazaré" ou "O Orfão", não têm faltado boas surpresas do cinema brasileiro recente no Queer Lisboa.E a mais recente pode muito bem ser este drama ambientado em Goiás que gira em torno de um triângulo amoro entre o protagonista, um colega de trabalho e um rapaz recém-chegado. Primeira longa de ficção de Nolasco, autor de curtas e documentários premiados, o filme tem sido aplaudido pela energia visual de um olhar sobre uma crise de meia-idade que não dispensa algum (homo)erotismo. Entre os aplausos conta-se o do Festival de Berlim, que o nomeou para o Teddy Award de Melhor Filme este ano.
"WELCOME TO CHECHNYA", de David France: Um dos retratos mais urgentes desta edição é este documentário filmado de forma clandestina na Chechénia, em torno de um grupo de activista s que tenta demover a campanha anti-LGBTQI+ da república russa. Cinema de guerrilha, a aposta da HBO recorreu a câmaras ocultas ou telemóveis para dar uma visão rara de um sistema repressor e foi das obras mais celebradas do Festival de Berlim deste ano - de onde saiu com quatro prémios e uma nomeação depois de já ter sido distinguido em Sundance. Além de um percurso reconhecido como jornalista de investigação, o realizador assinou "A Vida e a Morte de Marsha P. Johnson", sobre a activista trans que dá título ao filme (o documentário está disponível na Netflix).