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Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

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Insegurança global (e uma amizade para a vida em risco)

Ao fim de oito temporadas, "SEGURANÇA NACIONAL" despediu-se com um dos seus ciclos de episódios mais consistentes em muitos anos. E dos que melhor equilibraram os dilemas da esfera individual da protagonista com as ameaças de um cenário global.

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Quem acredita que a realidade supera a ficção tem em "SEGURANÇA NACIONAL" um bom argumento. Se nas primeiras temporadas algumas opções e viragens narrativas da série poderiam ficar limitadas ao campo ficcional, e a ingredientes indispensáveis de um thriller de espionagem bem oleado e entusiasmante, a última fase da aposta da Showtime (exibida em Portugal pela FOX) conta com situações que até já parecem comedidas face ao cenário global dos últimos anos.

Um presidente dos EUA indeciso, mal informado e facilmente manipulável será um dos exemplos mais flagrantes dessa aproximação à realidade no drama criado por Alex Gansa e Howard Gordon, e algumas cenas dos bastidores da Casa Branca que há uns anos talvez fossem inverosíveis têm agora um sabor amargo a recolhecimento.

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Mas a descrição do jogo de manobras da política norte-americana nem foi o mais interessante de uma temporada que reforçou a ambiguidade na descrição dos jogos de poder no Médio Oriente, em particular entre o Afeganistão e o Paquistão, recusando o maniqueísmo de algumas ficções centradas na realidade árabe ou na ameaça terrorista.

Ao lado de "Fauda" (disponível na Netflix), "SEGURANÇA NACIONAL" será dos melhores dramas recentes na tentativa de humanização de todos os envolvidos no conflito, caso especialmente comprovável na caracterização de Haissam Haqqani, líder talibã que já tinha marcado a quarta temporada mas que reapareceu agora com nuances que a série não tinha explorado.

Menos conseguido foi o retrato de John Zabel, uma das novas personagens, interpretada por Hugh Dancy, que não foi além da caricatura de conselheiro político calculista e de vistas curtas da ala conservadora, tendo sido introduzido mais como muleta do argumento do que como figura tridimensional pela qual os argumentistas se interessassem. Mas essa limitação, como outras que a recta final da saga também teve (da liberdade de movimentos da protagonista a alguns aspectos da sua relação com o agente russo Yevgeny Gromov, entre mais conveniências narrativas) não comprometeu uma despedida feita com um fulgor que a série já não tinha há muito - talvez desde a quarta temporada, aliás decisiva para parte dos eventos desta.

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Se a oitava época arrancou com um paralelismo entre a situação de Carrie Mathison e a de Nicholas Brody, cuja dúvida entre a lealdade e a traição deu o mote a "SEGURANÇA NACIONAL" há nove anos, os seus 12 episódios conseguiram dar novo fôlego a essa premissa, trocando as voltas a personagens e espectadores sem nunca descaracterizarem a protagonista. E esta dualidade acabou por rematar da melhor forma o seu relacionamento com Saul Berenson, a outra figura que se manteve na série desde os primeiros tempos e que teve agora um papel especialmente relevante, ao colocar em cena um confronto mural com consequências inevitáveis nas relações internacionais e na cumplicidade entre o mentor e a(s) sua(s) agente(s) de eleição (sobre a nova personagem que vem abalar este equilíbrio, diga-se apenas que resulta de uma sintonia difícil entre economia narrativa e um casting certeiro).

Não admira, por isso, que apesar de não terem faltado perseguições, explosões ou reviravoltas,  algumas das cenas mais intensas desta temporada tenham sido entre Claire Danes e Mandy Patinkin, que já eram ambos actores de topo do pequeno ecrã nos últimos anos e deixaram aqui alguns dos seus diálogos mais memoráveis, à medida que as suas visões do mundo se foram distanciando. Felizmente, o final da série respeitou a inteligência do espectador e não o forçou a escolher um dos lados (e aquele último plano, ao som de "Truth", de Kamasi Washington, foi qualquer coisa).

3,5/5

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