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Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

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O crime do padre Tomasz

Nomeado para Óscar de Melhor Filme Internacional em representação da Polónia, "CORPUS CHRISTI - A REDENÇÃO" é uma história de fuga à violência através da espiritualidade contada sem moralismos nem soluções fáceis. E faz querer ver mais tanto do realizador, Jan Komasa, como do actor principal, Bartosz Bielenia.

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A realidade pode ser mais estranha do que a ficção e a primeira alimenta a segunda neste filme baseado num caso verídico: o de um rapaz católico que, depois de sair de um centro de detenção juvenil, acaba por assumir o lugar de novo sacerdote de uma pequena localidade polaca - em vez de ir trabalhar como aprendiz de carpinteiro, ocupação que o destino parecia reservar-lhe.

Mas apesar desta premissa, "CORPUS CHRISTI - A REDENÇÃO" está menos interessado em centrar-se no episódio inusitado que levou a uma troca de identidade do que em explorar a forma como o protagonista e os que o rodeiam lidam e são afectados pela fé, propondo um retrato envolvente do ressentimento, da compaixão e do perdão quando poderia contentar-se com um exercício de suspense sobre um jogo de enganos.

Este olhar sobre a natureza humana e a partir da dinâmica de uma comunidade de luto aceita, ainda assim, ingredientes do thriller enquanto vai acompanhando a nova rotina do protagonista. E é uma rotina que não passa despercebida tanto na paróquia como nos arredores, com o pretenso padre Tomasz a apostar num formato personalizado de celebração eucarística, mais directo e menos solene, que não demora a ser acolhido de braços abertos.

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A mudança deixa, no entanto, de ser recebida de modo tão caloroso quando o pároco não só divide a comunidade como contraria o poder local ao romper com um caso de ostracismo surgido depois de uma tragédia. E ao aliar este cenário de quase guerra civil, pelo menos no plano moral, com a situação frágil do protagonista, "CORPUS CHRISTI - A REDENÇÃO" resulta num drama intenso e complexo, ancorado numa interpretação brilhante de Bartosz Bielenia (actor com um dos olhares mais expressivos revelados nos últimos tempos) e num elenco de secundários coeso - a quem o argumento trata de entregar figuras tridimensionais, independentemente do lado da barricada em que se encontram.

Nesta sua terceira longa-metragem (as anteriores não chegaram ao circuito comercial português), Jan Komasa mostra-se hábil numa vertente realista em atmosferas invernosas (com a paleta cromática a insistir em azuis e cinzentos) e não atira esta história para um relato inspirador beato nem para um panfleto contra a religião católica, mantendo-se focado nas inquietações de um protagonista ambíguo.

O cruzamento entre um passado de delinquência e um presente entregue à espiritualidade chega a lembrar o também aconselhável "Não Deixeis Cair em Tentação", de Cédric Kahn, infelizmente pouco visto. Mas espera-se que, nem que seja à boleia dos Óscares, "CORPUS CHRISTI - A REDENÇÃO" consiga chegar a mais públicos. E se pelo caminho for abrindo algumas portas internacionais a mais cinema do seu país, tanto melhor.

3,5/5

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