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Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

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Profissão de risco

Embora seja um filme à medida dos movimentos #MeToo e Time's Up, "WORKING WOMAN" não se limita a tentar captar o ar dos tempos. O apelo pode ser universal, mas o drama de Michal Aviad, em destaque no ciclo DIAS DO CINEMA ISRAELITA, ganha pela singularidade do seu retrato complexo e desconfortável de uma mulher "sob a influência".

 

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No papel, a premissa de "WORKING WOMAN" não anda longe da de (tele)filmes que têm "casos da vida" como mote, aqui com a tónica no assédio sexual no local de trabalho. Só que a história de Orna, cuja carreira promissora no mercado imobiliário sai gorada pelas investidas do chefe, é desenvolvida com nuances que a afastam tanto de um exercício programático e demonstrativo como a demonizações fáceis ou ao sensacionalismo de retratos comparáveis.

 

Michal Aviad, na sua segunda aventura na ficção, talvez deva parte da gestão desse equilíbrio difícil à sua experiência nos documentários, vincando este estudo de personagem com uma capacidade observacional assinalável. A realizadora israelita é bem sucedida no mergulho tanto na vida familiar como profissional da protagonista, não a limitando ao papel de vítima mesmo que vá dando conta da sucessão de microagressões a que é exposta logo deste os primeiros dias do novo desafio laboral.

 

Se o argumento não será sempre surpreendente, "WORKING WOMAN" dá a volta a um rumo esquemático pela atenção que a câmara vai dedicando à linguagem corporal e aos jogos de olhares, sobretudo de Orna, lado a lado com uma escrita perspicaz na abordagem dos relacionamentos, seja na esfera íntima ou pública - e principalmente nas situações em que essa fronteira se torna ténue.

 

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Liron Ben-Shlush, no papel da protagonista, é decisiva para que este drama se mantenha sempre assente num realismo bem captado, ao dar corpo à jornada de uma mulher cujo entusiasmo e brio profissionais vão sendo minados por obstáculos a que não sabe como reagir. "WORKING WOMAN" também não pretende apontar a solução, mas nos seus melhores momentos é certeiro na desmontagem dos abusos de poder que abrem caminho para a violência, psicológica e/ou física.

 

Hábil no desenho de uma atmosfera simultaneamente contida e claustrofóbica, às vezes a sugerir algum cinema de terror (ainda que longe da descida aos infernos do também recente "Custódia Partilhada", centrado na violência doméstica), Aviad vai moldando um novelo de tensão em crescendo com auge na cena mais explícita e crua, sem cair no gratuito. Infelizmente, também é a partir daí que vai perdendo algum impacto, numa recta final que não escapa por completo ao maniqueísmo evitado durante boa parte do filme, propondo uma resolução que, não sendo inverosímil, fica aquém do rasgo de outros momentos. O que não impede de encontrar em "WORKING WOMAN" muitos méritos além da discussão que poderá alimentar...

 

3/5

 

 

"WORKING WOMAN" é um dos filmes da 12.ª edição do ciclo DIAS DO CINEMA ISRAELITA, que decorre no Cinema City Alvalade, em Lisboa, de 19 a 22 de Setembro.