Saiam da frente, ela vai passar
Apesar de todas as limitações que impôs, ou precisamente por causa delas, o confinamento acabou por ser um período mais produtivo para muitos artistas do que talvez se esperasse. Foi esse o caso de ANA LUA CAIANO, cantautora que encontrou na quarentena o tempo e o embalo criativo para se aventurar mais a fundo nos arranjos das suas composições.
Rua em Quarentena, projecto criado a meias com a irmã, a realizadora Joana Caiano, juntou música e vídeo partindo de canções que conciliaram tradição e modernidade, além de sons de objectos do quotidiano, enquanto se debruçaram sobre o medo, a saúde mental ou relações à distância (filtrando a angústia com alguma ironia nas letras).
Entre bongos e teclados, flauta e sintetizadores, guitarra e programações ou até fitas métricas, a artista já estava longe do universo do piano clássico e do jazz, que vincaram a sua iniciação musical, rumo a uma linguagem que deverá ganhar contornos mais definidos no EP de estreia, e editar este ano pela Chinfrim Discos.
"Nem Mal Me Queres", o primeiro single do disco, voltou a sugerir heranças de cantos tradicionais à medida que avançou no experimentalismo electrónico, numa canção de (des)amor intrigante e promissora. Já "SAI DA FRENTE, VOU PASSAR", o segundo avanço, vai mais longe na estranheza com um relato de afirmação numa moldura instrumental percussiva, a abrir pontes a algum hip-hop e música de dança sem apagar pistas do país profundo. A meio caminho entre os sussurros lacónicos de uma Billie Eilish e as harmonias vocais das Sopa de Pedra, mas impondo-se a essas ou outras comparações, é uma das canções portuguesas de 2022 a descobrir, guardar a revisitar, e um grande cartão de visita para o EP.
Além do videoclip abaixo, também vale muito a pena espreitar o showcase para as SBD Sessions, um one woman show revelador de um à vontade impressionante na conjugação de camadas e loops: