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Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Uma série para quem gosta de cinema

Como fazer um bom filme quando os grandes estúdios insistem em seguir fórmulas batidas, apesar de muitas vezes rentáveis? Essa é a questão que atormenta a personagem de Seth Rogen em "THE STUDIO", a nova série da Apple TV+. Os primeiros episódios não sugerem respostas, mas propõem uma viagem curiosa e divertida aos bastidores de Hollywood.

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Dois anos depois de "Platonic", Seth Rogen regressa à Apple TV+ não apenas como actor e produtor executivo mas também enquanto criador, argumentista e realizador. "THE STUDIO", cuja autoria é partilhada com o seu cúmplice habitual Evan Goldberg e também com Peter Huyck, Alex Gregory e Frida Perez, mantém-se fiel à comédia, ainda que não no campo romântico ou aparentado. Aqui, a principal relação amorosa é a que o protagonista, recentemente nomeado director de um grande estúdio, mantém com o cinema desde cedo. Mas que pode estar à beira do fim quando um grande poder decisivo também traz grandes pressões corporativas associadas, como a personagem de Rogen descobre logo no primeiro episódio.

O capítulo inicial sugere e o segundo reforça que "THE STUDIO" é uma viagem aos bastidores de Hollywood mais conseguida do que a também recente (embora já cancelada) "The Franchise", da Max. Aqui o tom de sátira é mais astuto, os diálogos mais afiados, o ritmo mais absorvente e o elenco mais promissor - tanto os actores que encarnam figuras fictícias (destaque para actrizes como Catherine O'Hara e Kathryn Hahn) como os que fazem versões livres deles próprios (menção obrigatória para um muito empenhado Martin Scorsese, força motriz do arranque, ao qual se juntam ilustres como Charlize Theron, Steve Buscemi, Sarah Polley ou Greta Lee). 

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Não sendo especialmente original, até porque o retrato do que se passa atrás das câmaras já tem uma longa tradição no cinema - do influente "O Jogador", de Robert Altman, ao subestimadíssimo "Babylon", de Damien Chazelle, passando por vários filmes de Nanni Moretti ou Woody Allen -, "THE STUDIO" é especialmente aliciante para amantes da sétima arte sem deixar à porta quem não tenha cartão de cinéfilo. Terá fôlego narrativo para dez episódios? A resposta dependerá da forma como a série conciliar a profusão de convidados de luxo e referências mais ou menos óbvias com o mergulho nas inquietações pessoais e sobretudo profissionais do protagonista.

Para já, o resultado é aconselhável, das ambições e desilusões que se atropelam no primeiro episódio, "The Promotion", ao seguinte, "The Oner", incursão atribulada numa rodagem e em particular numa cena com um plano-sequência - opção estética que, não por acaso, também é seguida por Rogen e Goldberg na realização de todo este capítulo, a sublinhar a costela meta da série e exemplo de um virtuosismo técnico que também marcou "Adolescência" (Netflix) e "Demolidor: Nascer de Novo" (Disney+) por estes dias. Mas se a televisão parece estar mais cinematográfica, o cinema continua a ser outra coisa, lição que "THE STUDIO" não só não esquece como enaltece - mesmo reconhecendo que, às vezes, um grande estúdio tem de fazer muitos maus filmes até poder apostar num bom.

"THE STUDIO" estreou-se a 26 de Março na Apple TV+ e conta com novos episódios na plataforma às quartas-feiras.

O espião que veio do calor

O arranque da nova série disponível na SkyShowtime é uma lição de classe e subtileza, qualidades pouco vistas em superproduções recentes. Elevada por um Michael Fassbender no seu melhor (e a liderar um elenco escolhido a dedo), "A AGÊNCIA" dá novo fôlego a thrillers de espionagem sem precisar de inventar muito.

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Não falta pedigree à mais recente criação dos irmãos Jez e John-Henry Butterworth, argumentistas de "Jogo Limpo", de Doug Liman, ou "Le Mans '66: O Duelo", de James Mangold. A série que adapta a francesa "A Agência Clandestina" junta nomes como Michael Fassbender, Richard Gere, Jeffrey Wright e Jodie Turner-Smith, tem Joe Wright ("Orgulho e Preconceito", "Expiação") como realizador dos primeiros episódios e conta com George Clooney entre os produtores executivos.

Alem dos dez capítulos iniciais, "A AGÊNCIA" já tem uma segunda temporada garantida e talvez por isso não pareça querer carregar no acelerador - pelo menos não tanto como a também recomendável "Black Doves" ou a mais esquemática "A Diplomata", outras histórias de espionagem recentes do pequeno ecrã (ambas da Netflix). Mas o ritmo pausado assenta-lhe bem, pelo menos para já, sobretudo quando tem um Michael Fassbender magnético no centro de uma narrativa que cruza experiências de vários agentes da CIA em Londres.

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À primeira vista, o actor irlandês parece repetir aqui o papel de "O Assassino", filme de David Fincher que protagonizou há dois anos. Volta a surgir na pele de um homem estóico e calculista, de poucas palavras mas certeiro nas acções, inteiramente dedicado à sua missão. Ou assim parecia, até ao momento em que uma saída brusca da sua residência na Etiópia para o Reino Unido, a pedido dos seus superiores, o obriga a separar-se de uma mulher que não encara, afinal, como só mais uma peça tão estratégica como descartável.

Esse conflito entre o pessoal e o profissional, abraçado por Fassbender com a precisão e intensidade esperadas (em modo contido), é o elemento mais intrigante de "A AGÊNCIA", série que se revela mais escorreita do que desafiante nas tramas secundárias (da iniciação de uma jovem agente a missões na Bielorrússia e na Ucrânia), por muito que estas possam vir a trazer grandes surpresas pelo caminho.  

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Os acima mencionados Richard Gere, Jeffrey Wright e Jodie Turner-Smith ajudam a conferir segurança a um elenco sólido, mesmo que os primeiros episódios não mergulhem a fundo nas suas personagens. Joe Wright, por outro lado, entrega já tudo ao dirigir habilmente uma trama de espionagem, depois de um percurso que começou inspirado, em filmes de época, e se tornou irregular entre mudanças de registo. O britânico é muito bom a captar uma Londres envidraçada, dominada por reflexos e azuis metálicos, cenário perfeito para um retrato da solidão, alienação e desconfiança feito com uma respiração por vezes mais cinematográfica do que televisiva (sobretudo nas cenas domésticas de Fassbender).

Para esse efeito atmosférico de travo nórdico contribui também a direcção de fotografia do sueco Jakob Ihre, colaborador habitual do norueguês Joachim Trier ("Oslo, 31 de Agosto", "Ensurdecedor", "Thelma") e outra escolha a aplaudir numa série que sabe ir envolvendo o espectador.

"A AGÊNCIA" estreou-se a 10 de Fevereiro na SkyShowtime e conta com novos episódios na plataforma às segundas-feiras.