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gonn1000

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Muitos discos, alguns filmes, séries e livros de vez em quando, concertos quando sobra tempo

Todas as famílias são psicóticas

Relações familiares difíceis (e às vezes insuportáveis) dão o mote a dois dos filmes apresentados na 17.ª edição da KINO - MOSTRA DE CINEMA DE EXPRESSÃO ALEMÃ, a decorrer até quarta-feira no Cinema São Jorge e no Goethe-Institut, em Lisboa. Mas estes retratos também mostram como o drama pode conviver com o humor sem diluir o impacto.

As Componentes do Amor.jpg

"AS COMPONENTES DO AMOR", de Miriam Bliese: Resposta alemã a "Marriage Story"? É difícil ver esta primeira longa-metragem de uma realizadora com currículo nas curtas sem pensar no filme mais recente de Noah Baumbach, mas na verdade este drama conjugal até estreou uns meses antes. E se a história sobre o afastamento de um casal que aqui se conta tem semelhanças com esse filme da Netflix, ao deixar um olhar atento aos pormenores que não força o espectador a tomar partido por qualquer um dos protagonistas (nem julga as suas acções), a abordagem singular vai diluindo os paralelismos da premissa. Sem tentações de melodrama "à americana", Bliese aposta num minimalismo que vai da postura contida das suas personagens a enquadramentos que as colocam quase sempre em exteriores, sobretudo na entrada do prédio onde o casal viveu, com uma predilecção por planos de conjunto. E ao cruzar um olhar humano e arquitectónico que faz todo o sentido na relação e separação que acompanha, a realizadora deixa uma assinatura visual nem sempre evidente numa primeira obra, que conjugada com a sua desenvoltura narrativa (avançando e recuando vários anos sem deixar o espectador perdido) e com a sólida direcção de actores (a verosimilhança nunca se coloca em causa) a torna num nome a seguir a partir daqui. Só o final, sem a pungência que momentos anteriores pareciam sugerir, é que chega a ameaçar esse equilíbrio, mesmo que não traia a justeza emocional na forma como olha para as personagens.

3/5

Um Ano de Voluntariado.jpg

"UM ANO DE VOLUNTARIADO", de Ulrich Köhler e Henner Winckler: Originalmente concebido para a televisão, este drama modesto nos meios aguenta bem o salto para o grande ecrã ao revelar uma perspicácia assinalável na abordagens às relações humanas - e às familiares em particular. Colaboração entre um dos nomes-chave da Nova Escola de Berlim (Köhler) e um realizador conterrâneo que já não filmava desde a sua segunda longa-metragem "Lucy", de 2006 (Winckler), é um filme mais acessível do que boa parte da obra do primeiro, embora não destoe no seu percurso idiossincrático. Tal como em "Montag kommen die Fenster" (2006) e "Schlafkrankheit" (2011), há aqui uma liberdade narrativa que desconstrói códigos (como os do road movie) e entrecruza jornadas pessoais - desta vez, as de um pai e de uma filha -, mas o resultado é mais fluído e consistente do que o desses dois filmes, acompanhando com tanto desconforto como humor o desmoronar de relações depois de a protagonista, uma adolescente de uma pequena localidade alemã, perder o voo para a Costa Rica, onde iria cumprir o ano de voluntariado do título. Mostrando-se, mais uma vez, interessado por personagens de temperamento difícil, e muitas vezes conflituoso, Köhler deixa, ainda assim, um olhar empático sobre as suas frustrações e ressentimentos - às vezes até inesperadamente empático, e talvez aí se sinta mais a mão de Winckler. Não será ainda o grande filme que confirma as reacções mais entusiastas ao já distante "Bungalow" (2002), mas é um retrato comportamental bem curioso e surpreendente.

3/5

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