Uma amizade inevitável
"PLATONIC" podia ser uma comédia romântica, mas a dupla protagonista da nova aposta da Apple TV+ não chega a ultrapassar a fronteira entre a amizade e o amor. Pelo menos nos primeiros episódios de uma série que se revela sedutora, mesmo sem despertar o entusiasmo de uma paixão assolapada.
Em equipa que ganha não se mexe, o que ajudará a explicar porque é que Nicholas Stoller recuperou o par protagonista das suas comédias "Má Vizinhança" (2014) e "Má Vizinhança 2" (2016) para a série que criou ao lado da mulher, Francesca Delbanco.
Seth Rogen e Rose Byrne surgem, mais uma vez, a liderar o elenco uma história sobre relacionamentos contemporâneos com doses generosas de humor, ainda que agora não na pele de amantes mas de amigos. Ou melhor, de antigos amigos dos tempos da universidade que a vida, e em especial um desentendimento, acabaram por separar até ao dia, anos depois, em que os seus destinos voltam a cruzar-se. E a amizade é reatada, numa fase já com rotinas familiares e profissionais bem distintas e ameaças da crise de meia-idade.
Amizade ou algo mais? O ponto de partida de "PLATONIC" é claro: a série quer debruçar-se sobre a possibilidade de um homem e uma mulher serem amigos sem tentações de envolvimento amoroso ou sexual, questão que está longe de ser novidade, mesmo no contexto de uma comédia romântica, embora nem por isso deixe de ser promissora.
Qualquer lembrança de "Um Amor Inevitável" (1989), o icónico filme de Rob Reiner protagonizado por Meg Ryan e Billy Crystal, não será pura coincidência: no primeiro episódio as personagens fazem uma menção a essa comédia romântica, a preferida de muito boa gente, mas os primeiros três capítulos, estreados esta semana, deixam sinais de uma série que segue o seu próprio caminho.
A haver comparações próximas, até será com a escola de Judd Apatow, não só pela presença de Rogen, um dos cúmplices do autor de "Um Azar do Caraças" (2007), mas também pelo humor desbragado e pelas situações absurdas nas quais os protagonistas se envolvem.
Rogen nem se afasta, aliás, da imagem de homem que não quer crescer cristalizada pela esmagadora maioria dos seus papéis: aqui é um hipster (ou pós-hipster?) relativamente bem sucedido enquanto gerente de uma cervejaria e a lidar mal com o final de um relacionamento amoroso. Já Byrne tem um casamento estável e é mãe de três filhos, embora não se conforme com uma carreira de advogada consecutivamente adiada. À superfície, faz lembrar a dona de casa desesperada de "Physical", outra aposta da Apple TV+ onde tem brilhado, mas está muito longe da sua acidez e ambiguidade, mesmo que também não dispense tiradas mordazes.
Se individualmente estas personagens não parecem trazer grandes desafios aos actores, é quando se juntam que "PLATONIC" encontra o seu melhor, através de uma química evidente capaz de convencer até quem tinha reservas quanto à credibilidade desta amizade. Uma química que, ironicamente, Byrne não partilha, pelo menos para já, com Luke Macfarlane (recentemente resgatado de telefilmes do Hallmark por "Bros - Uma História de Amor", comédia romântica também assinada por Stoller), que interpreta o seu marido, apesar de o argumento também não lhe dar grande atenção nos primeiros episódios. Nada que comprometa o capital de simpatia inicial por uma das boas surpresas da comédia televisiva de 2023 - com ou sem romance à mistura...
Os três primeiros episódios de "PLATONIC" estão disponíveis na Apple TV+ deste 24 de Maio. A plataforma de streaming estreia um episódio todas as quartas-feiras.